O terceiro decêndio de agosto do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) será transferido nesta quarta-feira (20), com valor total de R$ 1,3 bilhão. Mas 16 cidades brasileiras não terão acesso ao recurso, porque estão com o repasse bloqueado no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), do Tesouro Nacional.
Quando um município entra no sistema, a prefeitura fica impedida de receber qualquer ajuda financeira da União. O impacto é ainda maior em cidades pequenas e médias, que dependem quase exclusivamente do FPM para manter suas contas em dia.
Segundo o especialista em orçamento público e mestre em políticas públicas pelo Ipea, Dalmo Palmeira, o bloqueio pode comprometer até o funcionamento básico da administração municipal:
“Para os municípios que são muito dependentes do FPM, praticamente significa a paralisação do funcionamento das atividades básicas do município. Em muitos deles, a maior despesa é com pagamento de pessoal. Então, se isso permanece durante algum tempo, acaba atrasando a folha de pagamento.”
Até 17 de agosto, os municípios bloqueados eram:
Com exceção de Cabo Frio (RJ), todos os municípios estão bloqueados há menos de um mês. No caso da cidade da Região dos Lagos, a situação é mais grave: desde janeiro, a prefeitura está impedida de receber valores do FPM. Apesar de ter grande parte da receita proveniente de royalties do petróleo, o bloqueio impacta diretamente o caixa municipal. A reportagem entrou em contato com a prefeitura de Cabo Frio para esclarecer os motivos da restrição, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
O bloqueio não significa perda definitiva dos recursos. Os valores ficam apenas retidos enquanto persistirem as pendências. Para reverter a situação, os gestores precisam identificar junto ao órgão responsável – Receita Federal, INSS ou tribunais – a causa do bloqueio e, em seguida, regularizar a situação. Só então o repasse é liberado.
O Brasil vive uma trajetória em que as despesas obrigatórias avançam de forma acelerada e pressionam o orçamento, mesmo diante de uma arrecadação recorde. Para ampliar a transparência e o controle social, a Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) lançou a plataforma Gasto Brasil, que mostra em tempo real o quanto é gasto pelo governo federal, estados e municípios.
Segundo dados do Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, a situação é crítica: mais de 90% do orçamento já está comprometido com despesas obrigatórias, como aposentadorias, salários do funcionalismo, Bolsa Família, saúde e educação. Se nada mudar, a partir de 2027 o país poderá viver um “apagão fiscal”, quando todos os recursos serão consumidos por gastos fixos, restando zero margem para investimentos em áreas como infraestrutura, saneamento e manutenção de serviços públicos básicos.
“As despesas continuam em crescimento real e isso ocorre há vários anos. A dificuldade é que o governo precisa financiar esse aumento sem conseguir ampliar receitas no mesmo ritmo”, explica Alexandre Andrade, diretor da IFI. Ele lembra que decisões tomadas na transição de governo, como a retomada da política de valorização do salário mínimo e a reativação dos pisos constitucionais de saúde e educação, intensificaram a pressão sobre as contas.
Além disso, alerta o especialista, a composição do orçamento já mostra sinais de desequilíbrio: “As despesas obrigatórias crescem acima das discricionárias, comprimindo gastos essenciais ao funcionamento da máquina pública e aos investimentos”.
Para ampliar a conscientização da sociedade sobre o tema, a CACB criou o Gasto Brasil, ferramenta que já vem sendo adotada por associações comerciais em todo o país. O presidente da Associação Comercial e Industrial de Uberlândia (Aciub), Fábio Túlio Felippe, destaca o papel da plataforma como instrumento de participação cidadã:
“O Gasto Brasil permite que entidades como a Aciub acompanhem, com dados oficiais, como os recursos estão sendo aplicados. Isso nos dá subsídios para dialogar com os governos e defender políticas públicas mais eficientes”, afirma.
Ele ressalta ainda a importância do envolvimento social: “Quando a comunidade tem acesso a informações transparentes, pode cobrar mais e se engajar em debates que são essenciais para o desenvolvimento econômico e social”.
De acordo com a IFI:
“Se nada for feito, a relação dívida/PIB vai seguir em trajetória crescente, o que afeta a percepção de risco, encarece os juros e compromete o futuro da economia”, adverte Alexandre Andrade.
Para especialistas, a realidade fiscal do país exigirá uma profunda reforma das despesas obrigatórias já a partir de 2027. “É preciso rever a política de vinculações e criar instrumentos de revisão periódica de gastos, como já fazem países da OCDE”, sugere Andrade.
Enquanto isso, iniciativas como o Gasto Brasil tentam trazer o tema para mais perto da sociedade, permitindo que cidadãos, empresários e gestores tenham clareza de como os recursos públicos estão sendo aplicados.
Como resume Fábio Túlio Felippe: “Transparência é o primeiro passo para cobrar eficiência. O Gasto Brasil coloca na mão da sociedade a chance de participar ativamente desse debate”.
Representantes do setor produtivo, parlamentares e integrantes do governo se reuniram nesta terça-feira (19), em Brasília, para discutir os próximos passos da reforma tributária. O encontro, promovido pela União Nacional de Entidades do Comércio e Serviços (UNECS) e pela Frente Parlamentar do Comércio e Serviços (FCS), buscou avaliar os impactos da mudança no sistema de impostos e apontar ajustes necessários antes do início da fase de transição, prevista para 2026.
Um dos temas centrais foi o regime do Simples Nacional, que concentra grande parte das empresas brasileiras. O vice-presidente jurídico da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), Anderson Trautman, lembrou que a proposta inicial da reforma não previa direito a crédito para as empresas do Simples — e que essa conquista só ocorreu após forte mobilização.
“A proposta inicial da PEC 45 não permitia nenhum direito a crédito para os optantes do Simples Nacional. O crédito só foi conquistado graças a um movimento liderado pela CACB, com apoio da UNECS. A partir daí, houve o engajamento de outras entidades e conseguimos garantir o crédito proporcional à faixa de enquadramento do optante pelo Simples Nacional.”
Trautman ressaltou ainda que o modelo da não cumulatividade, um dos pilares do novo sistema, pode trazer impactos importantes para empresas de menor porte e para a arrecadação. “São inúmeros ajustes que ainda serão necessários durante a tramitação no Congresso Nacional para que a reforma tributária traga aquilo que se pretende: simplificação, redução da burocracia e incremento da competitividade das nossas empresas.”
No campo político, o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), que preside a Frente Parlamentar do Empreendedorismo, defendeu mais rapidez na regulamentação e destacou a relevância do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será responsável por definir as alíquotas do novo tributo. Segundo ele, é preciso garantir que o modelo esteja pronto já no início da transição.
O deputado Domingos Sávio (PL-MG), presidente da Frente Parlamentar de Comércio e Serviços (FCS), também reforçou a necessidade de atenção ao impacto da carga tributária.
“Nós que produzimos, geramos emprego e geramos recursos para desenvolver qualquer política pública neste país temos que compreender melhor essa reforma tributária. Eu entendo que dá tempo de corrigir alguns erros fundamentais e, principalmente, impedir que outros erros venham a se somar, sobretudo na área tributária e financeira.”
Com a proximidade da fase de transição, entidades empresariais e parlamentares ligados ao empreendedorismo afirmam que vão manter a mobilização. O objetivo é garantir que a reforma cumpra sua promessa de simplificação sem ampliar desigualdades entre regimes e setores da economia.
O segundo decêndio de agosto do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), depositado nesta quarta-feira (20), costuma ser o menor dos três repasses realizados pela União a cada mês. Desta vez, os 5,5 mil municípios brasileiros dividirão R$ 1,395 bilhão, o que representa o terceiro pior resultado de 2025. Apesar de ser um repasse intermediário – tradicionalmente inferior aos outros dois do mês –, o montante transferido foi 13% menor do que no mesmo período de 2024.
O assessor de orçamento César Lima destacou a preocupação com o desempenho: “Esse foi o terceiro menor do ano, perdendo somente para fevereiro e para abril. Esperamos que não seja um mau sinal, que seja apenas uma sazonalidade, e vamos acompanhar os próximos decêndios para saber se esse resultado permanece em baixa ou não.”
O Fundo de Participação dos Municípios é uma das principais fontes de receita das prefeituras brasileiras, especialmente das cidades de pequeno e médio porte. Ele é formado por uma parcela da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que é repassada pela União. O objetivo é reduzir desigualdades regionais e garantir recursos para serviços públicos essenciais, como saúde, educação, infraestrutura e folha de pagamento. Em muitas localidades, o FPM representa a maior parte do orçamento municipal e é indispensável para manter o funcionamento da máquina pública.
Entre os estados, São Paulo e Minas Gerais concentram as maiores fatias do repasse – ambos com mais de R$ 171 milhões, a serem divididos entre municípios como Caçapava, Avaré e Lins (SP), além de Juiz de Fora, Ubá e Lambari (MG).
Na outra ponta, o Amapá, que possui apenas 16 municípios, recebeu 0,13% do total distribuído: R$ 1,6 milhão. Santana ficou com a maior parcela do estado, R$ 337 mil, seguida por Laranjal do Jari, que recebeu R$ 206 mil neste decêndio.
mapa
O bloqueio do FPM impede que as cidades recebam os recursos federais destinados a custear serviços essenciais, como saúde, educação e transporte. A suspensão geralmente ocorre por pendências com órgãos de controle, como Receita Federal, INSS ou tribunais, e pode comprometer o funcionamento da administração local.
Após um recesso parlamentar prolongado pelos protestos e pela ocupação do plenário na semana passada, o Congresso Nacional inicia uma semana marcada por debates e votações de temas sensíveis, que refletem a disputa política entre governo e oposição.
Na Câmara dos Deputados, um dos destaques será a criação de um grupo de trabalho para elaborar um projeto de lei contra a adultização de crianças e adolescentes nas redes sociais. O colegiado terá 30 dias para apresentar a proposta, que ganhou força após denúncias feitas pelo influenciador Felca Bress sobre perfis que expõem menores em conteúdos de cunho sexual para monetização. Uma comissão geral marcada para o dia 20 vai abrir a discussão com especialistas e representantes da sociedade civil.
Outro tema com potencial para avançar é o projeto que amplia a faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, reduz parcialmente a tributação de rendas até R$ 7 mil e aumenta a cobrança para rendimentos acima de R$ 600 mil anuais. A medida, já aprovada em comissão especial, aguarda votação em plenário.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), também sinalizou a possibilidade de retomar debates sobre foro privilegiado e sobre o projeto de anistia, que só será levado a plenário se houver maioria no Colégio de Líderes.
No Senado, a Comissão de Constituição e Justiça pode votar, na quarta-feira (20), a PEC 65/23, que trata da autonomia do Banco Central. O texto deve receber emenda garantindo competência exclusiva ao BC para disciplinar e operar o Pix, com gratuidade para pessoas físicas e proibição de transferência da gestão do sistema a outros entes.
Além disso, a pauta da semana inclui a Medida Provisória do programa “Brasil sem Miséria”, considerada prioritária pelo governo, e a taxação dos chamados “BBB” — bilionários, bancos e grandes empresas — para financiar programas sociais que podem beneficiar até 20 milhões de famílias. A disputa em torno da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a análise de vetos do presidente Lula à Lei do Licenciamento Ambiental também estão no radar.
Para o cientista político Eduardo Grin, a agenda legislativa deve enfrentar resistência e se estender para além desta semana. “São temas complexos e com alto potencial de polêmica, todos influenciados pelo ambiente político tenso que se intensificou com os eventos da semana passada”, avalia.
Se uma proposta em análise no Congresso for aprovada, motoristas que forem multados por dirigir sem portar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) poderão ter a penalidade automaticamente arquivada, desde que comprovem que estavam devidamente habilitados no momento da abordagem.
A medida prevê a alteração do Código de Trânsito Brasileiro para que o cancelamento ocorra durante o próprio processo administrativo, sem necessidade de prazos adicionais para apresentação do documento. A comprovação poderia ser feita na fase de defesa prévia ou em recurso, mediante apresentação da CNH válida.
A ideia surgiu como alternativa a um texto que estabelecia prazo de 30 dias para apresentar a carteira e evitar a multa. Na nova versão, esse prazo deixa de existir, já que o direito à contestação já é garantido no procedimento administrativo de autuação.
Para que a mudança entre em vigor, o projeto ainda precisa passar por todas as etapas de análise no Congresso Nacional e ser aprovado também pelo Senado.
A pesca no Brasil enfrenta um duplo desafio: a falta de dados confiáveis sobre os estoques pesqueiros e os impactos crescentes da emergência climática. Essa é a principal conclusão da 5ª edição da Auditoria da Pesca Brasil, estudo que será lançado na próxima quarta-feira (13/8), em Brasília, pela organização Oceana. O relatório anual é o mais abrangente levantamento sobre a gestão pesqueira no país e, em 2024, direciona os holofotes para os efeitos ambientais e sociais provocados pelo clima em transformação.
Entre os dados mais alarmantes, o estudo aponta que não há diagnóstico sobre 47% dos estoques de espécies marinhas e estuarinas exploradas comercialmente no Brasil. Pior: dos estoques que têm avaliação, 68% estão sobrepescados, ou seja, apresentam biomassa abaixo dos níveis sustentáveis. Além disso, mais de 90% não têm plano de gestão atualizado e medidas que limitem a captura dos recursos para evitar a sobrepesca.
Ademilson Zamboni, diretor-geral da Oceana, explica que o conhecimento sobre os estoques pesqueiros do Brasil ainda é muito limitado e, quando existe, vem de iniciativas pontuais. “Quando há investimento em estudos científicos para a avaliação de estoques, conseguimos ter informações sobre um número específico de espécies. Mas essa análise tem um prazo de validade, um tempo de vida útil. Passados cinco anos, se você não planejou uma nova avaliação, as medidas tomadas a partir da anterior — se é que foram tomadas — podem não ter mais valor, porque já não representam a situação real do estoque.”
Para Zamboni, uma das soluções seria criar um programa permanente de pesquisa e monitoramento, que realize frequentes avaliações dos estoques pesqueiros.
O relatório traça um raio-X da gestão da pesca marinha e estuarina no país com base em quatro eixos: estoques pesqueiros, pescarias, orçamento público e transparência. A análise deles revela um sistema ainda bastante frágil e despreparado para lidar com os impactos climáticos já em curso — como o aumento da temperatura das águas, a alteração das correntes marítimas e a crescente ocorrência dos eventos extremos, como enchentes e secas históricas, que afetaram diretamente a pesca no Rio Grande do Sul e na Amazônia nos últimos meses.
Segundo o diretor-científico da Oceana, Martin Dias, “a pesca é uma atividade totalmente dependente do ambiente aquático e qualquer alteração nas condições naturais — como temperatura da água, salinidade, volume de chuvas e ocorrência de eventos extremos — impacta diretamente os peixes e, consequentemente, quem vive da pesca”.
Ele explica que essas mudanças já são perceptíveis. “A água mais quente afasta espécies que vivem em águas frias. Peixes que dependem de condições muito específicas para se reproduzir simplesmente não encontram mais essas condições e desaparecem. Isso já acontece em locais como a Lagoa dos Patos, no Sul, e nos rios da Amazônia.”
Dias lembra que até onde a gestão pesqueira é avançada, os prejuízos são inevitáveis. “Mesmo países que fazem muito bem sua lição de casa — como o Chile — estão sofrendo perdas milionárias. O Brasil, que ainda monitora muito pouco e não atualiza sua legislação, está muito mais vulnerável. Nós não sabemos, por exemplo, quanto de sardinha pode ser pescado no ano que vem, porque não existe acompanhamento sistemático desse estoque.”
Na Amazônia, a seca histórica afetou severamente as comunidades ribeirinhas, que viram a pesca se tornar escassa diante da falta de água e da morte de peixes. “A mudança já aconteceu. Estamos vivendo uma emergência climática”, afirma Josana Pinto da Costa, pescadora artesanal do Pará.
No Sul, o excesso de chuvas também impôs prejuízos: “2024 foi o pior ano de pesca para nós, por conta dos fatores climáticos. O mar ficou mais violento, com mais lixo, e isso atrapalha demais a pescaria”, relata Daniel da Veiga, pescador artesanal do Rio Grande do Sul.
Apesar de um aumento de 85% no orçamento do Ministério da Pesca e Aquicultura em 2024 (R$ 350 milhões), o valor ainda é o segundo menor entre os ministérios do Executivo Federal. Apenas 39% desse recurso foi executado no ano passado, tendo sido investido somente R$ 32 milhões nas ações finalísticas de pesca.
Segundo Zamboni, “grande parte desse investimento foi para programas sociais relacionados à pesca e uma parte muito grande para a máquina funcionar. Sobrou muito pouco recurso para ações que levem à sustentabilidade e à melhor gestão da pesca.”
Ele aponta falhas graves, como a falta de monitoramento, de estatística pesqueira, de medidas de controle das pescarias, e questiona: “Como saber a eficácia das medidas de gestão se não fazemos monitoramento? Como garantir que, ao conceder licenças de pesca, estamos autorizando um número sustentável de embarcações se não controlamos o desembarque, nem produzimos dados confiáveis? Sem informação, não há como tomar decisões consistentes — e isso é crítico para a política pública”.
Mesmo com avanços, como é o caso do funcionamento integral dos fóruns de consulta e assessoramento (Comitês Permanentes de Gestão da Pesca), a ausência de dados públicos sobre a produção pesqueira e o estado dos estoques, ainda limita o controle social e o planejamento técnico.
A Auditoria da Pesca reforça a necessidade de um plano nacional estruturado de monitoramento, avaliação e adaptação das pescarias, com base na ciência, contemplando questões chave como emergência climática, sustentabilidade e justiça social. Para Martin Dias, a aprovação do Projeto de Lei 4789/2024, atualmente em discussão no Senado, pode ser um divisor de águas para a gestão pesqueira no Brasil.
“Esse Projeto de Lei torna obrigatória a elaboração de planos de gestão, o monitoramento dos estoques e a responsabilização do governo por essas entregas. Hoje, tudo isso depende da boa vontade de quem ocupa a pasta. A proposta cria diretrizes claras e vincula essas responsabilidades à autoridade pesqueira”.
Zamboni vai além. “Já passamos do tempo de agir. Adaptar as pescarias à nova realidade climática custa dinheiro, exige investimento, planejamento e mudança de práticas. Mas o custo de não fazer nada será muito maior — em vidas, empregos e alimentos”.
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que pretende alterar a jornada semanal de trabalho, reduzindo de seis para quatro dias úteis, reacendeu o debate sobre produtividade, bem-estar e impactos econômicos no Brasil. A medida, defendida pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP) por meio do movimento Vida Além do Trabalho (VAT), busca ampliar o tempo livre e de descanso, mas provoca divergências sobre a viabilidade no atual cenário do mercado de trabalho.
Para a empresária Geovana Cavalcante Bandeira, que comanda a Geo Sousa Moda em Maceió (AL), o projeto deve ser analisado com cautela. “Embora a ideia tenha como foco o bem-estar do trabalhador, precisamos analisar com profundidade os impactos econômicos e operacionais que isso pode gerar, principalmente em setores como o da moda, que envolvem uma cadeia longa de produção e muitas vezes prazos apertados”, alerta.
O economista e pesquisador da Unicamp, Sillas Souza, avalia que o trabalho, independentemente da profissão, representa algum tipo de sacrifício. “Mesmo que gostemos de nossas profissões e que nos sintamos felizes em nossos trabalhos, o ócio, sobretudo remunerado, é preferível. Portanto, sem exceção, o trabalho representará algum tipo de sacrifício, tanto a brasileiros quanto a quaisquer outras nacionalidades.”
Geovana destaca que, no segmento da moda, uma mudança brusca na jornada pode trazer custos adicionais e reduzir a competitividade. “Na minha marca, que trabalha com produção própria, coleções exclusivas e foco na sustentabilidade, uma redução da jornada de trabalho poderia afetar diretamente os prazos de produção, encarecer os custos e exigir reestruturações nos processos internos”, ressalta.
Já Sillas chama atenção para o fato de que a produtividade média brasileira é baixa e que experiências positivas em outros países dificilmente teriam o mesmo efeito por aqui. “Nosso mercado de trabalho é marcado por uma informalidade que chega a quase 40%, ou seja, para essas pessoas a mudança não significará nenhuma vantagem. E, a depender de como os custos trabalhistas adicionais serão repassados, é bastante razoável supor que essa informalidade cresça.”
A empresária também teme que a medida, sem contrapartidas, acentue problemas já existentes. “No setor de moda, que já lida com muitos desafios, como alta carga tributária, concorrência internacional e informalidade, a mudança brusca na jornada de trabalho, sem contrapartidas como incentivos fiscais ou linhas de crédito para readequação de empresas, pode pressionar ainda mais os pequenos e médios negócios e até levar à informalização ou demissões em algumas confecções”, afirma.
A Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) reforça essa preocupação. Para a entidade, mudanças estruturais como a proposta exigem amplo diálogo com o setor produtivo para evitar impactos negativos na geração de empregos. A CACB defende que eventuais alterações na jornada venham acompanhadas de medidas de compensação e políticas que aumentem a competitividade, garantindo equilíbrio entre a valorização do trabalhador e a sustentabilidade financeira das empresas.
Para o economista, setores como comércio e serviços seriam os mais afetados negativamente, já que dependem diretamente da presença dos trabalhadores para manter as vendas. “Nada sugere que as pessoas irão mudar a forma de fazer compras por conta da menor jornada dos funcionários. Isso obrigará o lojista a compensar a ausência de um vendedor com outro — e os custos, de uma forma ou outra, serão repassados aos preços, deixando todos, inclusive os funcionários, com menor carga de trabalho, mais pobres.”
Na visão de Geovana, o Brasil precisa investir mais em educação técnica, inovação e políticas para modernizar a indústria, em vez de focar apenas na carga horária. “Ficar discutindo apenas carga horária é limitar um debate que deveria ser mais estratégico. A produtividade não aumenta reduzindo horas sem investir em qualificação, processos eficientes e uso de tecnologia.”
Sillas acrescenta que ajustes mais simples, como a contratação por hora, poderiam trazer ganhos mais concretos. “Creio que se implementássemos no Brasil a contratação por hora de trabalho, ao invés de ‘por pacote mensal’ como é hoje, haveriam ganhos tanto para trabalhadores quanto para empresários. O mundo trabalha dessa forma e não me parece que estejam insatisfeitos.”
Enquanto o Congresso discute a PEC, empresários, especialistas e entidades como a CACB concordam em um ponto: a mudança na jornada de trabalho precisa considerar não apenas o tempo, mas as condições estruturais que garantam produtividade, competitividade e equilíbrio econômico.
A proposta que isenta do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil mensais e reduz parcialmente a tributação para rendas de até R$ 7.350 foi o centro das discussões, nesta terça-feira (12), em Brasília. O encontro, promovido pela Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), reuniu mais de dez entidades do setor produtivo e parlamentares para apresentar sugestões ao relator do Projeto de Lei 1.087/2025, deputado Arthur Lira (PP-AL).
O presidente da Frente Parlamentar do Empreendedorismo, deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), reforçou que a principal questão agora é encontrar alternativas para compensar a perda de arrecadação. “Temos problemas que temos que resolver, que é como cobrir os R$ 5 mil de isenção. Tivemos algumas propostas levantadas, como a taxação das bets. Nossa preocupação é como taxar o recurso que vem do investimento para cá.”
A Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB) participou ativamente das discussões. O vice-presidente jurídico, Anderson Trautman, destacou que a entidade acompanha de perto as reformas que afetam o setor produtivo e está atenta às pautas das reformas que impactam, sobretudo, o micro e pequeno empresário.
Segundo Trautman, é preciso garantir que a nova tributação não prejudique ainda mais os pequenos empreendedores, já afetados pela reforma do consumo.
“O objetivo foi trazer as nossas contribuições para minimizar, por exemplo, o impacto para o micro e pequeno empreendedor, que já é afetado pela reforma sobre o consumo. Trazer ajustes, como a tributação da distribuição disfarçada de lucros e a desoneração de algumas atividades, para que essa reforma contribua com a simplificação e o incremento da atividade produtiva, e não o contrário.”
Apesar dos desafios fiscais, o deputado Passarinho acredita que será possível encontrar um modelo equilibrado. “A única consciência que nós temos é a isenção dos cinco mil e agora fechar essa conta. Nós ouvimos a todos, vamos fazer os estudos, adequações e vamos achar o melhor modelo para fazer isso. Fizemos isso na reforma tributária, que era muito mais difícil. Como não vamos fazer isso também na isenção dos cinco mil?”, confirma o parlamentar.
Segundo ele, o diálogo é essencial para ajustar o texto e evitar desequilíbrios nas contas públicas.
“Têm muitas ideias que estão sendo lançadas e eu acho que a solução é essa: ouvir, ouvir os ruídos que o projeto está criando e as soluções, para fazer com que esse projeto seja neutro, que ele não cause despesas a mais para o Executivo, que já não tem recursos.”
Para a CACB, o debate sobre o Imposto de Renda deve vir acompanhado de outras reformas estruturais. “Na nossa ótica, de todo setor produtivo, deveria ter sido feita, em primeiro lugar, uma reforma administrativa. Então, pedimos, como setor produtivo, o engajamento de todos na reforma administrativa que tramita no Congresso Nacional.”
O PL 1.087/2025 já foi aprovado na Comissão Especial da Câmara e pode ser votado no plenário ainda este mês. Até lá, parlamentares e representantes do setor produtivo prometem seguir negociando para conciliar alívio tributário à população e sustentabilidade fiscal.
Líderes partidários devem definir prioridades em meio a impasses políticos e econômicos
O Congresso Nacional retoma os trabalhos nesta segunda-feira (11) com uma pauta marcada por temas de alto impacto político e econômico. Entre os assuntos previstos para a semana estão a proposta de anistia aos acusados de tentativa de golpe de Estado, a reforma administrativa, a PEC da Segurança Pública, a escolha de presidentes de agências reguladoras e a crise gerada pelo “tarifaço” imposto pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros.
Na Câmara, o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) reafirmou que a definição da pauta continuará sob responsabilidade do Colégio de Líderes, sem imposições. A votação da anistia só deve avançar se houver acordo entre as lideranças. Outro tema em debate é a PEC que prevê o fim do foro privilegiado para deputados federais, que enfrenta resistências e incertezas sobre apoio suficiente para aprovação.
No Senado, a atenção se volta para as sabatinas e votações de indicações para cargos estratégicos em agências reguladoras como ANS, Anvisa, ANP, Aneel e ANM. Apesar da instabilidade provocada por ações da oposição, as comissões mantêm a previsão de avançar com as análises. Também está na pauta a PEC 66/2023, que retira precatórios do teto de gastos, e a atualização da tabela do Imposto de Renda para dois salários mínimos, que precisa ser aprovada até o dia 11 para não perder validade.
A reforma administrativa volta ao centro das discussões com a realização, nos dias 15 e 16, de um seminário nacional organizado por entidades de servidores públicos. O encontro deve intensificar a pressão contra a proposta, que, segundo sindicatos, ameaça direitos e amplia a precarização do serviço público. No Congresso, o governo também tenta articular avanços em temas como o combate a supersalários e a reforma da previdência dos militares.
Na área econômica, o “tarifaço” norte-americano de 50% sobre cerca de 3,8 mil produtos brasileiros será discutido por uma comissão temporária de senadores. O grupo busca reverter ou minimizar os impactos da medida, que afeta setores estratégicos das exportações nacionais. Embora alguns itens tenham sido retirados da lista, o impasse continua e deve pautar negociações bilaterais nas próximas semanas.
Com o calendário eleitoral cada vez mais próximo, líderes avaliam que o avanço das pautas dependerá da capacidade de articulação do governo e de concessões às bancadas. O clima é de disputa intensa, com a agenda legislativa sujeita a bloqueios e manobras políticas que podem alterar o rumo das votações.