Marco legal do saneamento

05/03/2024 00:01h

Para alcançar a universalização dos serviços até 2033, o país precisa investir mais de R$ 890 bilhões

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Com investimento em saneamento básico, o Brasil pode arrecadar cerca de R$ 2 trilhões. A projeção é de relatório da Comissão de Meio Ambiente do Senado para avaliar a Política Nacional de Saneamento Básico (Lei 11.445, de 2007). Por meio de reuniões técnicas e audiências públicas, os debates contaram com a presença de especialistas e representantes das entidades públicas e privadas que atuam no setor. Conforme o levantamento, o país precisa investir mais de R$ 890 bilhões se quiser alcançar a universalização dos serviços até 2033. 

De acordo com o especialista em direito administrativo, regulatório e infraestrutura Marcus Pessanha, o retorno é significativo, mas para isso acontecer, é preciso comprometimento por parte de todos os envolvidos.

“O saneamento básico precisa ser prioridade do poder público, tanto nas esferas federal quanto estadual e municipal. Isso passa, por exemplo, dentre muitas medidas, pelo aumento da segurança jurídica, por meio do aperfeiçoamento do marco legal e do aperfeiçoamento de sua regulamentação”, avalia.

Ele reconhece avanços nos últimos anos, mas lamenta a quantidade de esgoto sendo jogado nos rios, o número elevado de lixões ativos e a grande porcentagem de brasileiros bebendo água não tratada. 

“Apesar de alguns pequenos avanços pontuais, ainda estamos muito distante da universalização dos serviços. Atualmente, mais de 30 milhões de pessoas não têm água tratada em casa, e mais de 74 milhões sequer têm coleta de esgoto. Então, à despeito da existência de pequenos avanços, a universalização ainda é uma meta muito distante a ser alcançada”, acredita.

O relatório destaca que os recursos públicos não são suficientes. São necessários recursos de financiamento, de bancos de fomento e de emissão de debêntures. O diretor-executivo da Abcon, Percy Soares Neto, também entende que a competição, a melhoria da regulação e a regionalização são os pilares que alicerçam todo um arcabouço institucional que levará o país ao atendimento da meta de alcançar 90% da população com esgoto coletado e tratado e 99% da população com água potável nas torneiras de casa.

“Nos últimos três anos, foram R$ 65 bilhões de investimentos contratados junto aos operadores privados. Isso tende a mostrar um ritmo importante no crescimento do investimento no setor”, conta.   

Na opinão do economista Newton Marques, o poder público precisa fiscalizar melhor o que tem acontecido e acompanhar as medidas que estão sendo adotadas. “A meta do serviço de coleta e tratamento de esgoto e distribuição de água até 2033 está comprometida. A questão orçamentária, as políticas públicas e a própria fiscalização não estão conseguindo cumprir o que foi estabelecido”, revela. 

“A disponibilização dos serviços de sanamento básico do Brasil será expandida e irá avançar sensivelmente nos próximos anos como decorrência do aperfeiçamento dos marcos legais, do aumento da segurança jurídica e da presença maior da iniciativa privada no setor. Todavia, entendo que a universalização demandará um tempo um pouco maior do que determinado pelos marcos legais e pelas expectativas”, analisa o especialista em direito administrativo, regulatório e infraestrutura Marcus Pessanha.

 

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03/03/2024 00:04h

Com 36,6%, a região é seguida pelo Nordeste, que aparece na segunda posição com 37,3% dos rejetos encaminhados para aterros

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Nas regiões Norte e Nordeste, apenas 36,6% e 37,3% dos rejeitos, respectivamente, são encaminhados para áreas ambientalmente adequadas. Os dados são da pesquisa Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2023, lançada pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA). Na opinião do superintendente da ABREMA ,André Galvão, o Brasil não teve uma evolução significativa em relação à disposição final apropriada de resíduos produzidos no país. Segundo ele, o índice de itens descartados enviados para aterros sanitários ainda é muito alto.

“A gente poderia imaginar que tudo que todo o lixo que é coletado é levado para um local ambientalmente adequado, um aterro sanitário, uma parte para reciclagem, compostagem, etc. Isso não é verdade. Grande parte do que é coletado no Brasil, ou seja, da população que é atendida pelo serviço de coleta vai parar em lixões — ou seja, locais ambientalmente inadequados de disposição de lixo”, lamenta.

O levantamento mostra ainda que a região Nordeste apresenta a menor abrangência de coleta seletiva porta a porta, atendendo apenas 1,9% da população. No Censo Demográfico 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) através do estudo Características Gerais dos Domicílios e dos Moradores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, em 455 municípios, nas cinco grandes regiões do país, menos da metade da população era servida por coleta direta ou indireta de lixo.

O ambientalista Charles Dayer não se surpreende com esse cenário insatisfatório. “Em vários municípios ainda existe a figura do lixão, a céu aberto. A gente tem uma política nacional de resíduos sólidos que prevê o encerramento da atividade dessas infraestruturas e substituição por aterro sanitário. Só que a gente vê recorrentemente o não-cumprimento disso”. Ele ainda continua:

“A nossa situação ainda é muito ruim, porque tem que haver um investimento muito maior tanto em mão de obra, burocracia, recurso nos municípios para que isso passe a ser uma realidade”, ressalta.

Sobre o PNRS

A política citada pelo especialista faz referência à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), do Ministério do Meio Ambiente, que trata da erradicação dos lixões em todo o Brasil. A lei determinava que nenhuma cidade tivesse lixão a céu aberto, até 2014. Sem condições de cumprirem as regras, o prazo para cumprimento dessa meta foi estendido para 2024. 

O superintendente da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA), André Galvão, acredita que esse processo ainda é lento no país, em face aos resultados obtidos até o momento. Na opinião do superintendente, o Brasil ainda conta com estruturas de disposição final de resíduos inadequadas, falta de sustentabilidade financeira para a operação das atividades e baixa recuperação dos resíduos coletados através da reciclagem.

Na contramão, os estados da região Sul se encontram mais avançados na aderência do que preconiza a PNRS, em especial Santa Catarina. O estado mais bem pontuado quase universalizou a destinação final para aterros sanitários e também conta com o maior número de municípios com cobrança pelos serviços — e tem os melhores indicadores de reciclagem, conforme o estudo.

Melhor cenário

As regiões Sul e Sudeste apresentam o melhor cenário com relação ao despejo dos resíduos sólidos indo para destinação adequadas. Com mais de 70% de cobertura, as duas são as únicas regiões do país com mais da metade dos resíduos sendo encaminhados para áreas ambientalmente apropriadas. Já no Centro-Oeste, 43,6% do lixo tem manejo adequado.

Em se tratando do serviço de coleta, locais como Santa Cruz de Minas (MG), Águas de São Pedro (SP) e Presidente Lucena (RS) foram as cidades com índices mais elevados de população servida por coleta de lixo, todas com 100,0% de cobertura.  

Possíveis soluções

O ambientalista Charles Dayer acredita que o Marco Legal do Saneamento é a melhor alternativa para resolver a questão do descarte do lixo, entre outros. Para ele, o novo marco de saneamento abre a possibilidade da iniciativa privada receber a concessão para explorar esse serviço nos municípios. 

“A iniciativa privada tem uma facilidade muito maior de fazer a gestão de recursos, sejam financeiros, pessoas e por aí vai, do que o poder público. O poder público é muito amarrado. A gente precisa que a regulamentação dos contratos, a fiscalização desses contratos de concessão sejam muito bem feitos. Então o governo e a iniciativa privada têm que atuar muito próximos nesse sentido para que o novo marco de saneamento tenha sucesso”, avalia.
 

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02/03/2024 00:06h

O número corresponde a 14,7% do total de residências no país, aponta Trata Brasil

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A possibilidade de ter um reservatório de água tratada ainda é um problema no país. É o que aponta uma pesquisa do Trata Brasil. Cerca de 10,856 milhões de moradias não tinham reservatórios de água em 2022 — ou ainda, 14,7% do total de residências no país. A presidente-executiva do instituto, Luana Pretto, acredita que ainda existem muitos desafios para tentar oferecer mais qualidade de vida a todos os habitantes. Para ela, a precariedade do serviço em determinadas regiões, dificulta ainda mais o processo.

“A população que não tem acesso hoje ao saneamento é uma população de até 20 anos, com um número maior de filhos, uma população autodeclarada parda e preta, com um ensino fundamental incompleto  —e com uma renda familiar de até R$ 2.400. Então uma população que vive muitas vezes em áreas vulneráveis”, observa. 

De 2016 até 2022, o número de moradias em privação cresceu de 10,157 milhões para 10,856 milhões. Segundo Pretto, os números mostram que o crescimento de acesso a essa infraestrutura não acompanhou o crescimento do número de moradias nesse período.

Conforme o levantamento, a maior parte das moradias com privação de reservatórios de água estava localizada nos estados do Nordeste, totalizando 3,473 milhões de habitações em 2022. Lá, 18,4% das moradias ainda não tinham caixa d'água. 

Na opinião da diretora e secretária executiva do Instituto Viva Cidades, Bia Nóbrega, existem estados que estão conseguindo avançar na oferta de um serviço de qualidade à população, mas admite que o esforço poderia ser ainda maior para permitir que a população consiga ter a infraestrutura necessária para viver com água tratada em casa.

“Obviamente, a gente viu avanços muito significativos quando a gente fala que até o final de 2022 a gente já tinha mais de 90 bilhões de reais em investimentos assegurados — e isso já é muito significativo. Mas a gente ainda precisa caminhar para um rumo que realmente leve à universalização em 2033, que ainda parece distante até mesmo com as políticas que a gente tem”, lamenta.

Falta de investimentos

O diretor executivo da Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon), Percy Soares Neto, acredita que para oferecer melhor qualidade de vida à população é necessário investimento. Para ele, as pessoas precisam ter condições de ter o mínimo para conseguir ter água tratada nas suas residências.

“A reversão desse quadro atual do setor de saneamento, suplantado no desafio de ter uma política nacional e um marco regulatório consistente, vai precisar de investimentos concretos. Mas para que esses investimentos ocorram há necessidade de uma decisão política dos entes, estados e municípios, em avançar no setor — e que eles possam ter a disposição mecanismos do governo federal que acelerem este tipo de investimento”, analisa. 

Entre os estados do Nordeste, a maior concentração de moradias com essa privação estava na Bahia, Maranhão e Ceará. Conforme os dados fornecidos pelo Trata Brasil, a maioria das habitações em estado de privação de disponibilidade de reservatório de água era de casas. 
 

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01/03/2024 04:15h

Cerca de 43% de todo o lixo gerado no país vão parar em lixões, valas, terrenos baldios e córregos urbanos, conforme estudo da ABREMA

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O Brasil avançou pouco na adequação do manejo dos resíduos sólidos no Brasil. Cerca de 43% de todo o lixo gerado no país tiveram descarte irregular, aponta a pesquisa Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2023, lançado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (ABREMA). O número corresponde a 33,3 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos indo parar em lixões, valas, terrenos baldios e córregos urbanos, ameaçando a saúde pública e o meio ambiente. 

O advogado e sócio da S2F Partners (consultoria especializada em gestão de resíduos e economia circular), Fabricio Soler, lamenta a situação. “O cenário da gestão e gerenciamento de resíduos no Brasil está estagnado. O índice de coleta gira em torno de 91% a 92%, 93%. O que significa dizer que o Brasil ainda tem 18 milhões de brasileiros que descartam nas próprias casas, terrenos baldios; ou seja, não tem coleta”, analisa.

Na opinião da especialista em direito urbanístico e ambiental Daniela Libório, o acesso da população à coleta de lixo e rede de esgoto ainda é precário no país.

“A situação continua complexa sem muito avançar em lugares distantes de grandes centros ou de grande vulnerabilidade social e urbana. Os municípios mais pobres continuam precários no atendimento de saneamento — assim como as periferias das regiões metropolitanas e mais pobres”, lamenta.

Segundo o especialista em gestão ambiental Raimundo Barbosa, o Marco Legal do Saneamento seria uma boa opção para resolver os problemas do descarte do lixo. “O marco legal do saneamento básico pode ajudar muito nesse sentido, uma vez que o governo pretende terceirizar o serviço de saneamento no Brasil como um todo. Então vai haver um aporte de recursos nessa terceirização para resolver o problema de implantação de infraestrutura de esgotamento sanitário para melhorar a questão dos aterros sanitários ou dos lixões que existem Brasil afora”, destaca.

Descarte irregular

Segundo o estudo da ABREMA, mesmo sendo uma prática considerada ilegal 27,9 milhões de toneladas de lixo foram enviadas para os mais de 3 mil lixões que ainda existem no país. Outras 5,3 milhões de toneladas são incorretamente descartadas pela população que vive em áreas não atendidas por qualquer tipo de serviço de coleta. O número representa 7% de todo o lixo produzido no país, indica o estudo.

O estudo mostra que as regiões Sul e Sudeste apresentam o melhor cenário com mais de 70% dos resíduos sólidos indo para destinação adequada. As duas regiões são as únicas do país com mais da metade dos resíduos sendo encaminhados para áreas ambientalmente adequadas. Já as regiões Norte e Nordeste, apenas 36,6% e 37,3% dos rejeitos, respectivamente, são encaminhados para aterros. No Centro-Oeste, 43,6% do lixo tem manejo adequado.

Um outro levantamento, o Censo Demográfico 2022 — divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através do estudo Características Gerais dos Domicílios e dos Moradores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua — revela que o lixo domiciliar de 7,9% das pessoas era “queimado na propriedade”, enquanto para 0,3% delas ele era “enterrado na propriedade”. De acordo com 0,6% da população, o lixo era apenas “jogado em terreno baldio, encosta ou área pública”.

Para o analista da PNAD Contínua Gustavo Geaquinto, esse percentual alto ainda assusta. 

“A fossa rudimentar, o esgoto sendo lançado diretamente em valas a céu aberto, rios e mar, correspondiam a 14,1% dos domicílios brasileiros que são consideradas formas inapropiradas de esgotamento — e inclusive podem trazer riscos para a saúde e para o meio ambiente”, explica.

Ainda de acordo com a pesquisa, a coleta direta ou indireta de lixo atendia 90,9% da população em 2022. Os tipos de descarte mais frequentes foram o “coletado no domicílio por serviço de limpeza” (82,5%) e o “depositado em caçamba de serviço de limpeza” (8,4%).

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27/02/2024 14:30h

Novo estudo do IBGE revela que os critérios de cor, raça e desigualdades regionais permanecem como destaques na problemática do saneamento básico

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Cerca de 24,3% da população brasileira ainda permanecia com condições precárias de esgotamento sanitário, em 2022. A porcentagem corresponde a 49 milhões de pessoas sem qualquer tipo de acesso a saneamento básico de qualidade, conforme Censo Demográfico 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os números mostram que as restrições de acesso a saneamento básico eram maiores entre jovens, pretos, pardos e indígenas. Já entre os serviços, a coleta de esgoto foi considerada a mais difícil por necessitar de uma estrutura mais cara do que as demais.

Na opinião do técnico de planejamento e pesquisa na Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Ipea Gesmar Rosa dos Santos, é muito mais difícil construir sistemas maiores de abastecimento de água em áreas com codições precárias de moradia e para muitas pessoas ao mesmo tempo.

“Para levar água, em geral, tem poços cisternas, soluções individuais. Ou então próximos de rios, próximos de açudes. Os ribeirinhos também captam de água de chuva. As pessoas dão a sua própria solução individualizada. Tem os vilarejos rurais, os centros comunitários, onde tem mais moradias próximas e aí são possíveis soluções chamadas coletivas”, relata.

O acesso à coleta de lixo é mais limitado nos municípios com menor contingente populacional, segundo dados do Censo. Somente 78,9% da população residia em domicílios com coleta de lixo, nas regiões com menos de 5.000 habitantes. No entanto, os municípios com 500.001 ou mais habitantes, a coleta de lixo chegava a 98,9% das pessoas. Foram 3.505 municípios brasileiros com menos da metade da população morando em domicílios com coleta de esgoto, enquanto 2.386 municípios residiam em domicílios com esgotamento por rede coletora ou fossa séptica.

Percy Soares Neto, diretor executivo da ABCON SINDCON (associação das operadoras privadas de saneamento), entende que o marco legal do saneamento é a oportunidade para que essas regiões — que carecem de serviços melhores — consigam ter condições adequadas de moradia.

“O emprego dessas soluções alternativas é recebido pelo marco do saneamento, então o marco do saneamento reconhece nessas situações que as soluções alternativas devem ser implementadas e devem ser consideradas aí como soluções”, avalia.

De acordo com o levantamento, apesar da proporção de domicílios com acesso à rede de coleta de esgoto no Brasil alcançar 62,5% em 2022, registrando aumento em relação a 2000 (44,4%) e 2010 (52,8%), 49,0 milhões de pessoas (24,3%) ainda usavam recursos precários de esgotamento sanitário.

Com a aprovação da lei nº 14.026/2020, o governo federal ficou responsável pela regulamentação do setor de saneamento. Em 2022, o Congresso Nacional aprovou o Novo Marco Legal do Saneamento na tentativa de aperfeiçoar os serviços no Brasil — e ainda garantir que 99% da população tenha água potável disponível e 90%, coleta e tratamento de esgotos até 2033.  
 

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24/02/2024 04:30h

Especialistas explicam por que as áreas rurais sofrem mais com a falta de tratamento e coleta de esgoto

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A necessidade de tecnologias especificas, baixo interesse político e falta de financiamento são alguns dos motivos que dificultam a prestação do serviço de tratamento de água e esgoto para a população que reside no campo. Na opinião do técnico de planejamento e pesquisa na Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Ipea, Gesmar Rosa dos Santos, as fragilidades estruturantes do setor nas áreas rurais, principalmente no Norte e Nordeste, onde o esgotamento sanitário é conhecido pelo grande déficit de atendimento, dificultam a oferta de saneamento básico adequado.

“Saneamento é infraestrutura. É caro e as pessoas não conseguem, não têm conhecimento em sua casa, pessoas mais simples do meio rural, aí você imagina quilombolas, seringueiros, ribeirinhos, outros povos tradicionais, têm muita dificuldade de entender o que fazer, achar a tecnologia mais adequada, dar manutenção e fazer o projeto para fazer uma instalação” O especialista ressalta: “Custam milhares de reais para fazer um sistema melhorado de esgotamento sanitário e de abastecimento de água”.

Os dados de cobertura dos serviços de saneamento básico extraídos do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério das Cidades e da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes ao ano de 2023, mostram que cerca de 72% da população rural ainda moravam em domicílios com elevada proporção de atendimento precário ou não atendimento pelos diferentes componentes do saneamento básico. 

Para Gesmar, atingir a meta de aperfeiçoar os serviços de saneamento básico no Brasil e garantir que 99% da população tenha água potável disponível e 90%, coleta e tratamento de esgotos até 2033 parece estar longe da realidade. Ele diz que a situação se torna ainda mais preocupante ao levar em consideração as áreas rurais.

“Nós estamos ficando para trás nisso, porque próximo de 4 milhões de pessoas — uma estimativa — têm algum tipo de tratamento nas suas casas, no meio rural. Só que a gente tem mais de 12 milhões de pessoas ainda esperando por algum tratamento. Essa é a questão grave no caso do Brasil”, reclama.

De acordo com dados do IBGE (2023), entre os domicílios rurais, 40,2% (ou 3,7 milhões) tinham fossa séptica não ligada à rede, enquanto 50,5% deles (ou 4,6 milhões) contavam com outro tipo de esgotamento em 2022.

Investimentos e apoio do poder público

A presidente executiva do Instituto Trata Brasi, Luana Pretto, aponta a falta de investimentos e de participação nos contratos de concessão, outro problema que atrasa ainda mais as obras de infraestrutura. 

“Quando se licita esse serviço ou ainda quando se faz um contrato entre a prefeitura e uma concessionária estadual de saneamento básico, muitas vezes a área de responsabilidade dessa concessionária é a área urbana. E por isso que muitas vezes fica a cargo da prefeitura a realização dos serviços de saneamento nessas áreas rurais”, esclarece.

Nesse contexto, Luana Pretto  destaca: “O Marco Legal de Sanhamento Básico, ele fala em se ter 99% da população com acesso a água e 90% da população com acesso à coleta e tratamento de esgoto. Mas ele não especifica se essa é uma área urbana ou se essa é uma área rural. Então isso precisa estar em discussão agora nos novos leilões”, lembra.

Segundo o diretor executivo da ABCON SINDCON, associação das operadoras privadas de saneamento, Percy Soares Neto, o saneamento rural segue sendo um problema grave no Brasil, porque muitas das soluções não têm escala o suficiente para ter um operador tecnicamente qualificado. 

“Nós vamos ter que ter programas que levem técnicos da área de saneamento para apoiar essas comunidades rurais, principalmente na adoção, na escolha, adoção, implantação e monitoramento dessas situações alternativas”, avalia.

O técnico de planejamento e pesquisa na Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Ipea Gesmar Rosa dos Santos acredita que o apoio do poder público é fundamental para que as ideias saiam do papel.

“Falta decisão dos governos para apoiar iniciativas das comunidades e ele próprio elaborar projetos e fazer obras e instalações, aumentar a melhoria e o atendimento com soluções alternativas, ou seja, individualizadas e coletivas, para levar água para essas pessoas e melhorar o sistema de saneamento básico. O tratamento tem que ser simplificado porque não tem como você fazer redes grandes nessas localidades”, ressalta.

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21/02/2024 04:10h

Isso se deve às dificuldades e ao elevado custo em se coletar e transportar o esgoto em regiões distantes, segundo levantamento do Trata Brasil

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Em termos relativos, 90,9% das moradias rurais não contavam com o serviço de coleta de esgoto até 2022, ou seja, ao levar em consideração apenas as residências nessas localidades, a maior parte das casas não tinha a oferta desse tipo de serviço. Os números são da pesquisa “A vida sem saneamento: para quem falta e onde mora essa população?”, feito pelo Instituto Trata Brasil. 

De acordo com a presidente executiva do Instituto Trata Brasi Luana Pretto, é possível perceber a diferença na oferta do serviço de coleta de esgoto quando se trata apenas do meio rural. Para ela, esse é um ponto que merece atenção.

“Em termos relativos quer dizer que do total de residências em áreas rurais, 90% não têm coleta de esgoto. Ou seja, mais um ponto de atenção ou seja. As moradias das áreas rurais tipicamente não possuem coleta de esgoto — e 10 em casa 100 não tem nem banheiro.”, lamenta.

No que se refere ao total das moradias brasileiras no país — área rural mais área urbana —, o levantamento mostra que a privação de coleta de esgoto em 2022 é maior nas áreas urbanas (62,7%) enquanto 37,3% corresponde às áreas rurais. “Isso acontece porque a gente tem uma densidade habitacional maior nessas casas que estão nessa área urbana. Além disso, também se deve às dificuldades e ao elevado custo em se coletar e transportar o esgoto em regiões distantes”, destaca Pretto. 

Para a presidente executiva do Trata Brasil, a área rural precisa de um esforço muito maior das autoridades para alcançar um serviço de saneamento básico com qualidade. Observar que 90,9% das moradias rurais estão sem o serviço de coleta, é um cenário que preocupa.

Na opinião da advogada especialista em direito ambiental Paula Fernandes, o governo tem que ter em mente que não são políticas de execução que custam barato e que trazem resultados de imediato. Mas é necessário ter vontade política para implementar um serviço que vai apresentar resultados para a população daquela região. Ela ainda reforça que as políticas públicas precisam chegar nessas moradias.

“É necessário alinhar esses fatores para que se crie ali uma janela de oportunidades, para que seja tomada a decisão de inserção da questão na agenda de políticas públicas e implementação efetiva dessas atividades. É urgente. É necessário cada vez mais exercer pressão sobre os atores políticos sobre essa situação do saneamento básico”, avalia. 

O estudo também apresenta a distribuição das moradias e da população por áreas rural e urbana e a parcela das moradias e das populações nas privações dos serviços de coleta. Em termos populacionais, a distribuição corresponde: 50,4% da população sem coleta de esgoto morando nas áreas urbanas das cidades brasileiras, enquanto que 49,6% das pessoas em privação estavam nas áreas rurais. 

De acordo com o ambientalista e professor da Universidade de Brasília (UnB) José Francisco Gonçalves, o Brasil precisa avançar na pauta do saneamento básico em todas as cidades e em todos os tipos de serviços, como coleta de esgoto e tratamento da água.

“Não é possível mais no século XXI, existirem casas sem água potável e sem rede coletora da água utilizada nesses domicílios, sejam eles domésticos ou comerciais e industriais. Isso tudo são atributos que estão previstos a serem alcançados até 2030. E isso requer com que muitos setores, tanto os setores produtivos brasileiros quanto o setor público, tenham compromissos e, por que não, possam se unir dentro de uma mesma política apartidária”, observa.

O Congresso Nacional aprovou, em 2020, o Novo Marco Legal do Saneamento. A lei nº 14.026/2020 tem o objetivo de aperfeiçoar os serviços no Brasil e ainda garantir que 99% da população tenha água potável disponível e 90%, coleta e tratamento de esgotos até 2033. 
 

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19/02/2024 04:20h

Mais de 100 milhões de pessoas no Brasil vivem privadas de serviços de saneamento

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Mais de 100 milhões de pessoas no Brasil vivem privadas de serviços de saneamento, de acordo com estudo do Instituto Trata Brasil. O levantamento, realizado em 2022, mostrou que o Nordeste lidera as regiões onde a população mais sofre com a falta dos serviços — são mais de 40 milhões de pessoas ou 39,5% do total da população em privação de saneamento.

O estudo considera os seguintes critérios: quando a moradia não está ligada na rede geral de abastecimento de água; quando a água não chega de maneira regular ou não tem reservatório para armazenar a água que chega; e quando a residência ou o banheiro não estão ligados à rede coletora de esgoto. 

A região Sudeste foi a segunda com maior número de pessoas com privação — 21,6 milhões de pessoas —, mas em termos relativos, a proporção verificada no Sudeste foi a menor entre as regiões, de apenas duas a cada dez pessoas. 

Em seguida, vem a região Norte com 15,9 milhões de pessoas em estado de privação — oito a cada dez. No Sul, 15,9 milhões de pessoas — um a cada dois habitantes, mesmo índice registrado na média nacional e no Centro-Oeste — vivia com alguma privação.  

A presidente do Trata Brasil, Luana Pretto, fala que existe a necessidade de um esforço enorme tanto no acesso à água, na qualidade da operação da distribuição, quanto em políticas habitacionais que levem banheiros para as residências, coleta e tratamento de esgoto — o que, inclusive, evitaria a proliferação de muitas doenças. 

“São pessoas na sua grande maioria jovens, de até 20 anos de idade, pessoas que têm todo um futuro pela frente e muitas vezes acabam sendo prejudicadas por esse não-acesso; de uma população com escolaridade média baixa, que geralmente tem o ensino fundamental incompleto, porque se desestimulam no processo de aprendizagem, na própria ida a escola; estamos falando de pessoas autodeclaradas pardas e pretas”, comenta. 

Necessidade de investimentos

Percy Soares Neto, diretor executivo da Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon Sindcon), explica como esse cenário pode mudar. 

“A reversão desse quadro atual do setor de saneamento, suplantado no desafio de ter uma política nacional e um marco regulatório consistente, vai precisar de investimentos concretos. Mas para que esses investimentos ocorram há necessidade de uma decisão política dos entes, estados e municípios, em avançar no setor — e que eles possam ter a disposição mecanismos do governo federal que acelerem este tipo de investimento”, analisa. 

Em 2020, o Congresso Nacional aprovou o Novo Marco Legal do Saneamento. A lei visa aperfeiçoar os serviços no Brasil e garantir que 99% da população tenha água potável disponível e 90%, coleta e tratamento de esgotos até 2033.

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29/01/2024 04:35h

Apenas 46,9% da população é atendida com abastecimento de água, segundo levantamento do Ministério das Cidades

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O Amapá é o estado com o pior índice no atendimento total de rede de água do país, onde apenas 46,9% da população conta com serviços de abastecimento. Os dados são do 'Diagnóstico Temático - Serviços de Água e Esgoto', levantamento do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério das Cidades, que usa como base de referência o ano de 2022.

O cenário alarmante, na opinião do ambientalista e professor da Universidade de Brasília (UnB) José Francisco Gonçalves, requer esforço conjunto das autoridades públicas para que os amapaenses tenham direitos mínimos garantidos.

“Quando você tem uma rede coletora, você diminui o impacto sobre os ecossistemas que recebem, que são receptores dessa água que foi utilizada pela sociedade. Tem esgotos de origem doméstica, esgotos de origem industrial, tem influentes de tratamentos, uma série de questões. Então, precisa de investimento dos governos federal, estadual e até mesmo municipais para que a água chegue e seja coletada depois de utilizada”, aponta.

Outros dois estados do Norte também aparecem na lista negativa. O Acre possui 48% no índice de atendimento total com rede de água, seguido pelo Pará, com 55,4%. Na outra ponta, São Paulo (95,3%), Paraná (96,1%) e Distrito Federal (99%) têm as melhores coberturas de abastecimento de água. Em nível nacional, o SNIS mostra que o índice de atendimento com redes públicas é de 84,9%, o que corresponde a pouco mais de 171 milhões de habitantes atendidos. Em relação a 2021, houve redução de 5,9 milhões de brasileiros com acesso à água potável, considerando o aumento do número de municípios.

Fiscalização

Em 2020, o Congresso Nacional aprovou o Novo Marco Legal do Saneamento. A lei visa aperfeiçoar os serviços no Brasil e garantir que 99% da população tenha água potável disponível e 90%, coleta e tratamento de esgotos até 2033. O senador Confúcio Moura (MDB-RO) é integrante da Comissão de Meio Ambiente do Senado, responsável por acompanhar o andamento da política de saneamento no Brasil. Segundo o parlamentar, a região Norte precisa de mais investimentos e fiscalização para reverter a situação precária.

“Essa avaliação de política pública é muito importante, porque normalmente as políticas são criadas e não são avaliadas. Isso tem um rastro enorme no Brasil de fracassos, fracassos com grandes programas maravilhosos”, alerta.

Estudo do Trata Brasil comprova que o menor índice de atendimento da população com redes públicas de abastecimento de água é da macrorregião Norte (64,2%), enquanto o maior está na macrorregião Sul (91,6%). A taxa contempla apenas serviços que utilizam redes públicas de água e não inclui soluções alternativas, como poços, nascentes, cisternas e chafarizes.

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26/01/2024 20:35h

Ao todo, foram 83,2 milhões de reclamações ou solicitações de atendimento e cerca 64,4 milhões de serviços executados, conforme diagnóstico do SNIS

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O Brasil contabilizou 75,8 mil paralisações nos serviços de fornecimento de água à população, em 2022. Foram 83,2 milhões de reclamações ou solicitações de atendimento e cerca 64,4 milhões de serviços executados. Isso significa que, durante o ano, uma parcela dos brasileiros teve interrupção nesse fornecimento decorrente de problemas em unidades do sistema de abastecimento (da produção à distribuição), causada por fatores como queda de energia e reparos, dentre outros. As informações são do Diagnóstico Temático Serviços de água e esgoto 2023 — que usa como base de referência o ano de 2022 —, um estudo do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), administrado pelo Ministério das Cidades. 

O assunto preocupa o professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília José Francisco Gonçalves Júnior. 

“Muitas cidades têm problemas de tubulações velhas, rompimento, vazamentos, boa parte da energia captada nos ecossistemas, tratada nas unidades de tratamento de água para abastecimento”.

 O professor ainda destaca a perda da água que chega nas residências. “Às vezes essa perda é tão grande que há uma interrupção e precisa consertar. Então, um processo de manutenção deveria ser feito constantemente”, avalia.

Nesse mesmo ano, o Nordeste foi a região com o maior número de paralisações. Ao todo foram 38,6 mil ocorrências (50,9%). Em segundo lugar, o Sudeste com 17,2 mil (22,7%) e na sequência, a região Sul 9,2 mil (12,1%), Centro-Oeste 6,0 mil (7,9%) e Norte 4,7 mil (6,2%).

José Francisco acredita que o problema vai mais além. “A questão de atendimento de água e esgoto não é um problema da demanda ambiental, e sim de serviços provenientes do Estado, como prevê a nossa Constituição, em fornecer água, abastecimento de água a todo cidadão brasileiro e, obviamente, coletar essa água”, ressalta.

Além das paralisações, o levantamento mostra um estudo sobre a qualidade do serviço, os registros de interrupções sistemáticas — supressão no fornecimento de água decorrente de problemas como produção, pressão na rede e subdimensionamento das canalizações, provocando racionamento ou rodízio do atendimento. Ao todo, foram 432,9 mil ocorrências.

Nesta situação, o Nordeste aparece mais uma vez .no topo da lista. A região registrou 385,4 mil (89,0%) interrupções sistemáticas. Bem atrás está o Sudeste e o Centro-Oeste com 15,1 mil (3,5%). O Norte vem na sequência com 9,2 mil (2,1%) e, por último, a região Sul com 8,1 mil (1,9%).

Na opinião da presidente-executiva do Instituto Trata Brasil, Luana Pretto, os números mostram que o Brasil avançou pouco no serviço de saneamento.

“A gente precisa aumentar esse volume de investimentos, ter as soluções endereçadas pelos governos, seja uma solução pública ou privada, independentemente do modelo que for adotado”, cobra. 

De acordo com o diagnóstico SNIS, o total corresponde à quantidade de registros no ano, inclusive repetições, de paralisações com duração de seis ou mais horas. A base de informações é o município. 

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