O líder da oposição no Senado, senador Rogério Marinho (PL-RN), protocolou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), para invalidar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que responsabiliza jornais por declarações de entrevistados, em suas reportagens. Antes de ser protocolada, a proposta ainda ganhou mais uma assinatura e subiu para 28 o número de senadores que a subscrevem.
Segundo Marinho, a iniciativa foi apresentada "no sentido de resgatar um dos pilares mais importantes da democracia, que é a liberdade de expressão". Em entrevista exclusiva ao Brasil 61, o parlamentar reafirmou sua discordância em relação ao entendimento da Corte. "A recente decisão do Supremo, que permite que veículos sejam responsabilizados por afirmações, narrativas ou declarações feitas por entrevistados vai na contramão dessa necessidade que toda a sociedade detém", declarou, acrescentando que "não podemos, mesmo que de maneira indireta, impedir que a liberdade de expressão se realize e que a Imprensa faça o seu papel".
A proposta apresentada por Rogério Marinho propõe a inclusão de um parágrafo ao artigo 220 da Constituição Federal, que estabelece que o "veículo de comunicação não responde civilmente quando, sem emitir opinião, veicule entrevista na qual atribuído, pelo entrevistado, ato ilícito a determinada pessoa”.
“A responsabilização de um veículo de comunicação simplesmente porque um indivíduo expressou suas opiniões à imprensa é uma medida que, a nosso ver, restringe de maneira muito clara a liberdade de imprensa. Essa liberdade é um pilar fundamental da nossa democracia e deve ser preservada a todo custo", justifica o texto da PEC.
Com número suficiente de assinaturas (mais de 1/3 dos 81 senadores), a PEC foi protocolada e, se aprovada, seguirá para análise da Câmara dos Deputados.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) divulgou nota apontando que há “riscos” para a liberdade de imprensa presentes na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ao tentar responsabilizar a Imprensa por declarações de outras pessoas.
Para a entidade, o STF usa termos “genéricos e imprecisos”, que podem “ampliar o cenário de censura e assédio judicial contra jornalistas e comunicadores”. Entre os riscos, a Associação destaca o perigo "de responsabilização de casos em que o entrevistado imputar falsamente crime a terceiro quando, à época da divulgação, houver indícios concretos da falsidade da imputação e o veículo deixar de observar o "dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios".
Outra entidade de peso no mercado de comunicação e Imprensa, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) também se pronunciou. Além de fazer um comunicado público, o presidente da ANJ, Marcelo Rech, declarou à reportagem do Brasil 61 que a decisão do Supremo colocou em risco a liberdade de expressão e pode levar jornalistas e donos de veículos de comunicação à autocensura.
Marcelo Rech adverte que a decisão do STF cria um clima de insegurança que prejudica o trabalho de jornalistas e ameaça a liberdade de Imprensa. "A decisão é preocupante, porque cria um ambiente de insegurança em relação ao que pode ser publicado ou não", alerta, acrescentando que, "neste sentido, é uma ameaça à liberdade de Imprensa e deveria ficar claro como devem proceder os jornais e outros veículos de comunicação, no interesse da sociedade poder se informar livremente".
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Prevaleceu no STF o voto do ministro Alexandre de Moraes, que defendeu fixar a tese de que a liberdade de Imprensa deve ser consagrada a partir de um binômio: “liberdade com responsabilidade”. De acordo com Moraes, “não se trata de censura prévia”, mas da possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas e, em relação a eventuais danos, materiais e morais”.
O direito e o interesse de a sociedade se informar livremente está em risco, segundo o presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais), Marcelo Rech. Para o empresário, a recente decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de condenar o Diário de Pernambuco em virtude de o jornal ter publicado declaração de um entrevistado, acusando de crimes outra pessoa, colocou em risco a liberdade de expressão e pode levar jornalistas e donos de veículos de comunicação à autocensura. Uma medida que provoca tensão entre os comunicadores, incluindo os jornalistas profissionais, que trabalham no cotidiano divulgando declarações alheias.
A sentença da Suprema Corte foi decidida em plenário virtual no dia 8 de agosto passado, por 9 votos a 2, acatando a ação proposta apresentada por um ex-deputado do Partido dos Trabalhadores, segundo a qual o veículo de Imprensa é responsável pelas opiniões do entrevistado (veja a decisão, ao fim desta reportagem).
Para o presidente da ANJ, “a decisão é preocupante porque cria um ambiente de insegurança em relação ao que pode ou não ser publicado”. Rech entende que a sentença representa “uma ameaça à liberdade de Imprensa". Ele ressalta o clima de insegurança que deve prejudicar o trabalho de jornalistas, daqui pra frente.
“É importante que, no momento da definição da redação do voto do STF, fique claro como devem proceder jornais e outros veículos de comunicação, no interesse maior da liberdade de Imprensa com responsabilidade, mas no interesse sim, é claro, da sociedade poder se informar livremente”, afirmou o presidente da ANJ (veja a nota oficial da entidade, mais abaixo).
Além de ouvir a ANJ, o portal Brasil 61 procurou repercutir a decisão do STF com juristas e entidades representativas da Imprensa e do jornalismo profissional, como a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) – além da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (ABERT).
O professor e jurista Antonio Carlos de Freitas Junior — advogado e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo (USP) —, considerou a decisão do Supremo desproporcional. Conforme o especialista, “a sentença é desproporcional, na medida em que o direito à liberdade de Imprensa foi demasiadamente diminuído para garantir o direito individual de um único cidadão”.
Para Freitas Junior, a decisão não revoga de forma completa a liberdade de Imprensa, mas viola profundamente esse direito:
“O direito à liberdade de Imprensa é fundamental para o acesso à informação e para a formação da livre convicção e do livre pensamento pela população”, lembrou o professor, acrescentando que, de acordo com a Constituição, “devem ser integralmente garantidas as liberdades de manifestação do pensamento, criação, expressão e informação”.
Ele lembra que “o STF, enquanto Estado, não poderia atuar de forma a tolher direito tão relevante para a construção de uma sociedade democrática, que busca a liberdade e a justiça entre todos os seus integrantes”.
No caso do jornal Diário de Pernambuco, segundo o especialista, o Supremo baseou sua decisão em inibir crime de calúnia (quando é falsamente imputado fato criminoso a outrem) por parte de um entrevistado. O especialista destacou que a sentença, na realidade, “gerou o dever a todos os meios de comunicação de ficarem obrigados a pesquisar de forma aprofundada todas as informações mencionadas por seus entrevistados, sob pena de serem responsabilizados caso haja alguma inverdade”.
O mestre em Direito pela USP afirmou que isso “é um verdadeiro absurdo, uma vez que o papel da Imprensa é de divulgar as informações recebidas, não de fazer juízo de legalidade destas”.
De acordo com o constitucionalista, nem mesmo o Poder Legislativo, materializado no Congresso Nacional através da escolha de parlamentares eleitos pelo povo para ocupar as cadeiras da Câmara e do Senado Federal, poderia retirar o direito à liberdade de Imprensa garantido pela Constituição de 1988.
“A liberdade de Imprensa de fato é um direito fundamental, consubstanciado nos direitos à liberdade de manifestação, ao exercício de profissão e ao acesso à informação, não podendo ser objeto de proposta de emenda constitucional que tenda a aboli-los — e não podendo ser modificados nem mesmo pelo Congresso Nacional”, declarou Freitas Junior. Segundo ele, a única forma de alterar este cenário seria através da elaboração de uma nova constituição no país.
O especialista explicou que, no sistema constitucional brasileiro, pode haver colisão entre direitos fundamentais. Portanto, “cabe ao Poder Judiciário atuar para ponderar os direitos e apresentar decisão que ampare ao máximo possível os direitos em conflito”.
No caso decidido recentemente, o professor explica que “observa-se o conflito entre o direito à liberdade de Imprensa do jornal e o direito à imagem e honra do cidadão” que foi alvo das declarações. Conforme Freitas Junior, isso explica, portanto, o motivo de o especialista entender que a decisão é desproporcional, pois o direito à liberdade de Imprensa foi muito diminuído para garantir o direito de uma única pessoa.
O mestre em Direito Constitucional pela USP alertou que, depois da decisão da suprema corte brasileira, veículos e profissionais de Imprensa deverão agir com muita cautela.
“O STF abriu a possibilidade de que qualquer indivíduo que sinta que teve a imagem ou a honra feridos por falas veiculadas pela Imprensa (mesmo aquelas apenas repassadas, que não são de autoria do próprio veículo ou jornalista) possam ingressar com ações na Justiça, pedindo indenização por tal ocorrência”, observou. “É possível a condenação dos veículos de Imprensa e, a depender do caso, até mesmo do profissional responsável pela matéria”, alertou Freitas Junior.
A reportagem do Brasil 61 procurou saber a opinião das principais entidades do país que defendem os interesses de veículos de comunicação e também a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) – principal entidade de classe que reúne os profissionais que exercem o jornalismo no Brasil.
Apenas a ANJ (Associação nacional de Jornais) se pronunciou. Nem a ABI (Associação Brasileira de Imprensa), nem a Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) e nem a Fenaj deram continuidade às ligações telefônicas ou responderam as mensagens encaminhadas por e-mail.
"Entendo que a decisão afeta negativamente a liberdade de imprensa, pode levar a um estado crescente da autocensura e a uma restrição ainda maior da difusão de conteúdos jornalísticos de interesse público. A decisão é um retrocesso que abre um precedente muito perigoso de punir o mensageiro por declarações de terceiros. O mais inusitado no caso é que a entrevista foi publicada em 1995 e a confirmação de que o autor da ação não teve envolvimento no atentado ocorreu em 2013 na Comissão da Verdade. Por sua gravidade, o caso está sendo acompanhado por entidades internacionais e seguramente vai afetar ainda mais a imagem brasileira nos rankings de liberdade de imprensa."
Marcelo Rech, presidente-executivo da ANJ
O STF decidiu, no dia 8 de agosto passado, que um veículo de comunicação pode ser responsabilizado por injúrias, difamações ou calúnias proferidas por um ou mais de um entrevistado. No caso concreto, a corte condenou o Diário de Pernambuco pelo fato de o veículo ter divulgado declarações nas quais um entrevistado imputou crimes a outra pessoa.
O caso envolve o ex-deputado federal Ricardo Zarattini (PT-SP), acusado de ser um dos autores do atentado a bomba no aeroporto de Guararapes, em Recife (PE), em julho de 1966. Zarattini sempre negou participação no caso.
Em 1995, o Diário de Pernambuco entrevistou o ex-delegado da Polícia Civil Wandenkolk Wanderley, que disse que o petista era o autor intelectual do crime. A inocência de Zarattini viria a ser confirmada apenas em 2013, o que motivou sua ação contra o veículo por ter veiculado a declaração do ex-policial.
Prevaleceu no STF o voto do ministro Alexandre de Moraes, que defendeu fixar a tese de que a liberdade de Imprensa deve ser consagrada a partir de um binômio: “liberdade com responsabilidade”. De acordo com Moraes, “não se trata de censura prévia”, mas da possibilidade posterior de análise e responsabilização por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas e, em relação a eventuais danos, materiais e morais”.
Encontro online acontece no dia 3 de maio, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, às 16h
A Comissão de Liberdade de Imprensa da OAB-SP e a Associação Brasileira de Editores de Revistas (ANER) abriram as inscrições para o encontro online “Jornalismo local e liberdade de imprensa”, com data marcada para o dia 3 de maio.
O evento acontece no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa e reunirá profissionais do ramo em um debate sobre sigilo da fonte, os desafios da imprensa na cobertura diária e a importância do jornalismo local para as comunidades.
Entre os convidados estão o diretor executivo de Jornalismo e âncora da Bandnews FM do Rio de Janeiro, Rodolfo Schneider, o editor executivo do Diário da Região, de São José do Rio Preto (SP), Fabrício Carareto, e a presidente da APAMAGIS (Associação Paulista de Magistrados), Vanessa Ribeiro Mateus.
Para fazer sua inscrição e participar do debate, acesse o site.