Ficou para depois das eleições municipais de outubro a votação do projeto de lei que flexibiliza a Lei da Ficha Limpa. Considerada por alguns juristas e parlamentares como um enfraquecimento da lei aprovada em 2010, o PL 192/23 — da deputada Dani Cunha (União-RJ) — prevê, entre outras mudanças, a alteração da contagem do início e também o prazo de duração da inelegibilidade.
O adiamento da votação foi um pedido do relator da proposta, senador Weverton (PDT-MA) ao presidente do senado, Rodrigo Pacheco, que foi acatado. O que na opinião do cientista político André César, foi uma decisão acertada.
“É um problema sério, não pode ser tratado de afogadilho. Eu achei interessante essa posição do Rodrigo Pacheco de jogar só para depois das eleições, até mesmo para não contaminar esse debate ", diz o cientista.
Para Cesar, todo aperfeiçoamento de lei precisa estar no debate, mas não a qualquer custo.
“Tem que ser discutido com muita acurácia, essa matéria vai ter que ser vista nos detalhes e não pode ser votada rapidamente. É muito importante aperfeiçoar a legislação, desde que isso seja feito com muito cuidado.”
De acordo com a proposta em votação, o período de inelegibilidade passaria a ser único: de oito anos. Prazo que deve ser contado a partir da data da decisão que decretar a perda do mandato; ou do dia da eleição que ocorreu prática abusiva; da condenação ou da data da renúncia ao cargo eletivo.
Mas para o advogado e professor da FGV, Jean Menezes de Aguiar, a polêmica do projeto não incide apenas na alteração dos prazos. Para ele, é um retrocesso.
“Se existe uma lei de ficha limpa e você passa a flexibilizá-la, estamos, no mínimo, admitindo o vulgarmente considerado “ficha suja”, o que é um horror.”
O especialista ainda levanta outro ponto polêmico. “É um desvio de finalidade, pois está na cara que isso visa beneficiar pessoas determinadas. Há aí, como uma manifestação jurídica do poder legislativo, um desvio de finalidade, que é uma coisa que também pode ser amplamente discutida no poder judiciário”, critica Menezes.
Lembrando que pela regra atual, em algumas situações, o candidato fica impedido de disputar eleições por um prazo maior que oito anos.
Texto prevê que inelegibilidade não poderá passar de 12 anos
Foi uma aprovação simbólica, sem registro nominal dos votantes, mas fato é que o relatório do Projeto de Lei Complementar nº 192/2023 passou pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado e prevê a redução do prazo de inelegibilidade dos políticos definido pela lei da Ficha Limpa.
Segundo o texto aprovado, os políticos cassados e condenados não poderão se eleger por oito anos a partir da condenação em segunda instância. A proposta estabelece ainda que o período máximo de inelegibilidade não poderá ultrapassar 12 anos. Hoje, o prazo de inelegibilidade é contado a partir do final da pena ou do mandato do político.
Para o relator da proposta, senador Weverton Rocha (PDT-MA), não trata-se de uma mudança.
“Esse projeto que acabou de ser aprovado corrige uma pequena distorção de um projeto que nós aprovamos chamado Lei da Ficha Limpa lá atrás. Houve muita má fé de alguns setores que desinformam a população, que nós estamos querendo facilitar a volta ou a vinda de pessoas que são ficha suja para a política, mas isso não é verdade. É hipocrisia a gente falar em pena perpétua para quem cometeu algum tipo de erro no Brasil.”
Na mesma sessão ainda foi aprovada a tramitação em regime de urgência do texto, que segue agora para votação em plenário.
Com uma população cada vez mais descrente da idoneidade do corpo político brasileiro, o cientista político Nauê Bernardo explica que, para quevum projeto como esse ande, é necessário que haja um apelo popular — o que não existe neste momento. Por isso, o especialista não acredita na aprovação do texto. Sobre a Lei da Ficha Limpa, Bernardo pondera.
“O prazo de inelegibilidade é uma punição que sempre foi cercada de muita polêmica, porque muitas vezes impede que a pessoa condenada consiga, efetivamente, voltar à cena política mesmo após a reabilitação, uma vez que a política é composta desses movimentos momentâneos que dependem muito da pessoa estar no lugar certo na hora certa. Então, por ser um ponto polêmico, é natural que em determinados momentos históricos você tenha aprovação de projetos de lei que acabam mexendo nisso.”
O projeto ainda não tem data para ser votado em plenário.