Patricia de Moraes Mello Boccolini, professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis (FMP/Unifase). Imagem: Brasil61
Patricia de Moraes Mello Boccolini, professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis (FMP/Unifase). Imagem: Brasil61

Hepatite B: saiba mais sobre a doença e a importância da imunização

Enfermidade acomete o fígado e pode provocar sérias consequências. Crianças menores de um ano devem tomar três doses da vacina para garantir a imunização

SalvarSalvar imagemTextoTexto para rádio

ÚLTIMAS SOBRE SAÚDE


Caderneta de Vacinação em dia é sinônimo de saúde bem cuidada. O documento colabora na prevenção de uma série de doenças, entre elas a hepatite B. Nos últimos anos, contudo, o Brasil não tem conseguido cumprir a meta de imunizar 95% das crianças menores de um ano contra a doença. Em 2022, segundo dados do Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde, 80,03% das crianças de até 30 dias tomaram a primeira dose da vacina.

Para saber mais sobre a importância da imunização e detalhes sobre a doença conversamos com a pesquisadora e coordenadora do Observa Infância Patricia Boccolini. O Observa Infância é uma iniciativa conjunta entre a Fiocruz e o Centro Arthur de Sá Earp Neto (Unifase), a Faculdade de Medicina de Petrópolis, que investiga, monitora e divulga dados e informações sobre a saúde de crianças de até 5 anos no país.

Brasíl 61: Patrícia, seja muito bem-vinda ao Brasil 61. Queria que você explicasse  o que é uma hepatite e qual a diferença entre os diferentes tipos de hepatites que existem no Brasil.

Patrícia Boccolini: O que diferencia é o vírus, o da Hepatite B, por exemplo, é um vírus que pode causar danos no fígado, e para ele a gente tem vacina. A vacina da Hepatite B é a principal forma de prevenção, porque depois a gente não tem um tratamento medicamentoso ou uma cura, digamos assim, então a principal forma é a prevenção com a vacinação ainda na infância, para crianças menores de um ano, a gente três doses, que é uma dose ao nascer, depois seguindo de duas doses, ou seja, é uma vacina multidoses, e que ela protege praticamente para a vida inteira, a criança e depois o adulto fica a vida inteira protegido contra esse vírus dessa hepatite B. A gente tem outras hepatites também de origem bacteriana, só que essa tem essa característica específica de a gente ter a vacina, e é uma vacina aplicada ainda na infância.

Brasil 61: Como está atualmente a situação da cobertura vacinal contra a Hepatite B no Brasil?

PB: Infelizmente, seguindo como os outros imunizantes, a cobertura vacinal está baixa. A cobertura vacinal para Hepatite B deveria ser, a nossa meta para essa faixa etária de menores de um ano, seria vacinar pelo menos de 95% de todo esse público menor de um ano e, por exemplo, no ano passado, a gente chegou a cerca de 75%, isso cobertura nacional. 
A gente tem umas disparidades regionais, estaduais e municipais muito grandes, a  gente tem uma heterogeneidade muito grande. Ou seja, nacionalmente a gente tem esse dado, que é bem abaixo dos 95%, só que a gente tem disparidades, ou seja, a gente tem municípios que essa cobertura não chegou nem a 20%, ou seja, a gente tem essas disparidades, e a gente sabe que a vacina funciona coletivamente, ela é uma proteção coletiva, então de muito pouco vai adiantar, por exemplo, uma cidade como o Rio de Janeiro ter atingido a meta, porém todas as cidades da região metropolitana não, porque as pessoas circulam, então por isso é importante a gente atacar essa heterogeneidade, ou seja, ter uma cobertura mais homogênea, aumentar a cobertura vacinal como um todo.
Então esse número nacional já traz um impacto por estar longe da meta, mas também vamos precisar ter um olhar particular porque ainda temos alguns municípios com uma cobertura que está muito aquém da que a gente precisa para realmente as crianças estarem imunizadas.
E um outro fato, como eu falei anteriormente, essa é uma vacina multidoses, e isso traz um outro complicador, por quê? A primeira dose é basicamente ao nascer, a gente toma ela junto com a BCG, nos primeiros dias de vida, e depois você toma mais duas doses com menos de um ano. 
Porém é muito comum a cobertura dessa primeira dose é até bem alta, só que depois a gente tem uma dificuldade em fechar esse ciclo, em completar essas três doses, e isso também é bem problemático porque a criança não está protegida se ela tomou só uma ou duas doses ela não está protegida contra  hepatite B, então é importante também isso, não só tomar a vacina mas completar o ciclo das três doses.

Brasil 61: E quais estratégias têm sido adotadas para completar esse  ciclo vacinal, aumentar a quantidade de crianças vacinadas, principalmente por causa dessa situação da peculiaridade de cada cidade, que faz que a cobertura seja tão heterogênea.

PB: As iniciativas obviamente vão variar de município para município, porque tem alguns questões que não são tão problemáticas em algumas cidades mas podem ser em outras. Por exemplos: a questão da busca ativa que está sendo muito usada agora, ou se não foi está começando a ser muito usada em alguns municípios, só que ela vai ser mais eficaz naqueles municípios onde a cobertura da atenção primária também é maior, onde você tem mais agentes, não é à toa que cobertura vacinal está intrinsecamente relacionada com a cobertura da atenção primária. 
Um dos resultados nossos do Observa Infância é esse: aqueles municípios que têm maiores coberturas de atenção básica eles geralmente também são municípios com melhores coberturas vacinais como um todo. Isso destaca a importância dessa busca ativa, desse agente comunitário, ele conhece seu território mais do que ninguém, então ele sabe quantas crianças tem ali, quantas crianças menores de um ano e quantas crianças que não tomaram, que estão com a caderneta incompleta por algum motivo, então esse é um recurso.
Tem municípios que já estão deixando o posto aberto por mais tempo, ou mais tarde, ou abrindo aos sábados, que a gente sabe que isso também é questão importante, de ter mais tempo para poder levar, os pais trabalham e muitas vezes não conseguem chegar a tempo para vacinar seus filhos. A questão que também está ali ligada à própria atenção básica, que são as dúvidas, que é essa questão de comunicação com a população. 

Não é só a vacina da hepatite B que é multidoses, existem outras vacinas multidoses. Nesse primeiro ano de vida, a criança vai quase mensalmente tomar várias doses de vacinas ao mesmo tempo, e isso muitas vezes pode confundir aquele pai, então por isso é importante não só a caderneta mas esse diálogo com esse profissional de saúde que está lá no posto para tirar as dúvidas e apontar a importância de estar vacinando, que é proteção contra várias doenças E isso é um ganho para a gente, porém muitas vezes faz surgir dúvidas na população. 

Se não vacinar seu filho a gente tem uma chance real de que doenças já erradicadas voltem, a gente tem sim, aconteceu com o sarampo por exemplo, em 2019 perdemos nosso selo de erradicação do sarampo em território nacional, porque em 2018 a gente teve várias surtos de sarampo no Brasil e desde então, esse é um dado também do Observatório Infância, de 2019 para cá a gente 26 óbitos de crianças menores de cinco anos por sarampo no Brasil. 26 óbitos de crianças por uma doença que a gente já tem a vacina e a vacina está disponível no SUS, e isso é uma situação que a gente tem tinha a décadas, e num intervalo de menos de cinco anos teve 26 óbitos, isso é muito chocante e é preciso que a gente explique para esses pais o que pode acontecer com seus filhos. 
Óbito é uma questão extrema, mas tem algumas doenças que também deixam sequelas importantes, como a pólio, que está erradicada do território nacional, mas a gente está com a cobertura  de poliomielite muito baixa, ou seja, é um risco real de retorno se a gente mantiver nossas coberturas baixas sim, porque a pólio ainda circula no mundo, a gente tem países ainda que a pólio é endêmica, então a gente precisa estar explicando para esses pais que não é porque ele não está vendo nenhuma criança com pólio de pólio que ela não existe mais, que ela foi erradicada do mundo. 

Brasil 61: E quando a pessoa já está infectada com hepatite B? Quais os principais sintomas, como essa doença é transmitida e como a pessoa se sente após a infecção?

PB: Ela vai começar a apresentar enjoos, dores, muitas vezes  a pessoa vai apresentar isso já na idade adulta, essa é uma vacina relativamente recente no calendário vacinal. Então a gente tem que tomar depois de adulto, agora para aquela pessoa que não tomou é importante que tome. Ela pode ser passada por contato sexual também, então ela é altamente contagiosa, e a única prevenção é a vacina. 
E os sintomas são muito semelhantes aos de uma virose, então muitas vezes a pessoa demora a procurar atendimento porque ela acha que é algum resfriado, alguma coisa com pouca gravidade, porém é importante estar atento a isso principalmente se você nunca tomou a vacina, é importante estar atento a esses sintomas, porque ela pode acarretar danos permanentes ao fígado, câncer de fígado, e a óbito também. E conviver com uma doença crônica no fígado tem realmente muita gravidade, e a gente tem óbitos de hepatite B no Brasil, mas não recente de crianças.

Brasil 61: Como acontece o diagnóstico?

PB: Após esses primeiros sintomas você vai ter que procurar o médico e aí ele vai começar a fazer algumas perguntas e descartar. A primeira pergunta que é feita é se você foi ou não vacinado. Aí você tem alguns testes que você pode fazer para fechar o diagnóstico da doença, que não é um diagnóstico apenas clínico, ele também tem alguns exames que você pode fazer.

Brasil 61: E o tratamento?

PB: O tratamento é basicamente você ficar convivendo, não tem uma cura, por isso é importante a vacina. Você tem uma prevenção contra a  doença, porque uma vez que você tenha a doença os tratamentos vão ser a depender da  gravidade de cada paciente e você não tem medicamento direcionado para isso. Você vai ter que conviver com aquilo e algumas questões mais paliativas para você conviver com o vírus. Isso é importante frisar, a gente não tem uma cura. Você vai tratando os sintomas daquela doença, você não trata a doença, por isso que é importante a gente estar frisando a importância da vacinação, que o principal remédio, digamos assim, é a vacina.

Brasil 61: Agora a gente deixa o espaço aberto para suas considerações finais.

PB: É importante que a gente sempre mantenha as cadernetas das crianças atualizadas, nosso calendário vacinal é muito rico, protege contra várias doenças, e doenças que podem gerar sequelas e gerar óbitos nas crianças, e são vacinas que estão disponíveis no SUS de forma gratuita. 
Então é importante que a gente vacine nossos filhos, entenda a importância disso e fique atento também a essas vacinas que são um pouquinho mais complexas no sentido de ter duas ou três doses, que é importante a gente fechar o ciclo para de fato estar protegido contra aquela doença específica. E que não tem problema nenhum tomar várias vacinas juntas, o calendário está dividido a ponto de, se tem alguma vacina que não pode ser tomada junta, ela já está separada, como a da febre amarela, que se dá quando a criança está com 11 meses, e se dá sozinha. Então é importante a caderneta estar sempre atualizada, que é uma das principais coisas que a gente pode fazer pelos nossos filhos.
 

 

Receba nossos conteúdos em primeira mão.