Cédulas de dólar americano. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Cédulas de dólar americano. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Relator do marco legal do câmbio acredita que texto vai impulsionar adesão do Brasil à OCDE e melhorar vida das empresas e turistas brasileiros

Em entrevista ao portal Brasil61.com, o senador Carlos Viana (PSD/MG) explicou as mudanças na legislação cambial, que possui portarias e normas de quase 100 anos

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O Senado deve analisar ainda este ano o novo marco legal do mercado de câmbio (Projeto de Lei 5387/19). Aprovado  na Câmara dos Deputados em março, o PL quer modernizar, simplificar e dar eficiência ao setor. O texto revisa mais de 40 dispositivos legais, como leis, decretos e portarias que tratam sobre o tema, alguns que datam do início do século 20. 

De autoria do Banco Central, o projeto de lei pretende permitir que bancos e instituições financeiras possam investir no exterior recursos captados no Brasil; autorizar a atuação de fintechs no mercado de câmbio; e tornar o Real mais conversível e utilizado em outros países. As mudanças, no entanto, não atingem apenas as empresas, pois trazem melhorias para cidadãos brasileiros, principalmente os turistas. 

Para entender melhor a proposta, o portal Brasil61.com entrevistou o relator do PL no Senado, o senador Carlos Viana (PSD/MG). O parlamentar destacou que, além de modernizar a legislação cambial brasileira, o texto impulsiona a candidatura do Brasil à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Confira abaixo. 

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“Vai alinhar o Brasil às melhores práticas internacionais do setor”, diz senador sobre novo marco legal do mercado de câmbio

Senador, por que é importante modernizar o mercado de câmbio brasileiro? 

A legislação brasileira do câmbio é de 1935, ainda da era Getúlio Vargas. De lá pra cá foram vários remendos legislativos, que criaram uma série de regras totalmente desatualizadas. Nós ainda temos imposições para transferências com anotações em papel, por exemplo, que não existem mais no mundo digitalizado, onde as transações são feitas via internet, também por sistemas muito mais modernos que garantem, inclusive, mais segurança para os países operadores. Portanto, é urgente que entreguemos ao país um novo marco do câmbio, atualizando todos os detalhes, todos os posicionamentos sobre esse assunto na relação do Brasil com o restante do mundo. 

Quais os principais pontos do marco legal do mercado de câmbio, já aprovado pela Câmara e que, agora, está no Senado? 

São dezenas de modificações que vão facilitar e muito a vida dos turistas brasileiros, dos estrangeiros e, principalmente, das empresas que operam com o câmbio. Uma das principais é a desburocratização. Nós teremos transações com muito menos exigência, mas sem, em momento algum, perdermos o controle sobre onde elas são feitas, como elas são feitas, de onde elas vêm e qual o destino dessas operações de câmbio em todo o mundo. Essa transparência que o marco do câmbio vai permitir ao Banco Central reforça a fiscalização, combate o chamado câmbio negro e, naturalmente, garante uma concorrência maior para aqueles que lidam com essa questão, precisam contratar câmbio para as exportações, para o pagamento de negócios lá fora. Acredito que essa desburocratização seja a principal contribuição para o mercado do câmbio brasileiro. 

A proposta impacta a vida do cidadão, do turista e do estudante brasileiro no exterior? Se sim, como?

Muita gente não sabe, mas quando viajamos ao exterior só podemos comprar dez mil reais em moeda estrangeira. Nossa intenção é passar [esse limite] para dez mil dólares. O turista [passa a] ter essa relação com a moeda estrangeira fixa, que facilita muito, inclusive, em câmbios diferentes, em épocas diferentes, como a que estamos. [Além disso], sabia que se você tem uma sobra de trezentos, quatrocentos, quinhentos dólares, quando volta ao Brasil é crime vender esse dinheiro? A pessoa pode ser processada criminalmente por conta da proibição que existe no Brasil da venda de dólares fora das casas de câmbio. Agora, nós vamos permitir que a pessoa possa vender até quinhentos dólares, tranquilamente, sem ser incomodada pela justiça.  É adaptar a legislação à realidade dos turistas, à nossa, do dia a dia de brasileiros

Um dos mitos que se criou com a proposta é de que qualquer brasileiro vai poder ter conta em dólar ou outra moeda estrangeira no Brasil. Não é bem assim, certo? Pode nos explicar, por favor? 

O novo marco garante que um depósito em conta no Brasil poderá ter também um paralelo em conta no exterior para investidores. Hoje, a pessoa quando quer investir no câmbio tem que fazer uma operação especial, contratar cotas junto a quem oferece. Mas a partir do marco do câmbio poderá haver essa opção. Um ponto interessante é que quando um estrangeiro envia um dinheiro para o país, uma família aqui em Governador Valadares, por exemplo, que é marco da imigração brasileira, tem de mandar via casa de câmbio, de remessas. A partir do marco, não. O banco tendo uma correspondência no exterior, o imigrante pode fazer o depósito lá fora e, naturalmente, a família no Brasil receberá o equivalente ao câmbio aqui. A mesma coisa o brasileiro. Já se podia com o cartão de débito fazer um saque lá fora na conta do Brasil. A pessoa vai sacar agora direto também da conta dela. É uma questão apenas de autorização que antes tinha uma série de outros procedimentos e que agora está muito facilitado. Mas isso não significa que nós vamos dolarizar a economia. O que nós estamos fazendo é apenas facilitando, legalizando e trazendo a possibilidade de investimentos fora e dentro do Brasil com muito mais rapidez e por muito mais players, outros operadores além dos bancos e casas de câmbio tradicionais. 

O senhor acredita que a modernização do mercado de câmbio vai ajudar o processo de adesão do Brasil à OCDE? 

A OCDE tem uma série de regras e padrões sobre operações contábeis, por exemplo, como as empresas brasileiras prestam conta, tem os seus balanços publicados. A OCDE também exige do país transparência nas contas públicas, nas operações de títulos da dívida externa e nas operações de câmbio. Um dos pontos principais da OCDE é o combate às remessas ilegais ao mercado negro. O Brasil é signatário de vários acordos internacionais de controle desse fluxo internacional de câmbio. Portanto, a legislação garante ao Banco Central e ao Ministério da Economia a atualização necessária para adaptação às exigências da OCDE e dos parceiros internacionais que as criaram. Portanto, acredito que sim, poderá facilitar e muito, será um passo a mais para que nos juntemos ao grupo de países desenvolvidos, onde essas regras ajudam e muito no desenvolvimento interno de cada um dos participantes. 

Por fim, o projeto teria algum impacto no preço do real frente ao dólar a longo prazo?

Naturalmente que facilitar a entrada de moeda estrangeira e também as remessas retira boa parte da pressão sobre o câmbio brasileiro, que é feito ainda de forma muito engessada por meio de grandes operadores. Haverá uma facilidade maior para se ter acesso a essas moedas. Portanto, a dependência de se comprar apenas em alguns lugares vai diminuir. Agora, o câmbio no Brasil tem uma série de condicionantes para que o valor seja atingido, principalmente a questão das contas públicas. Com relação à legislação, estamos fazendo as mudanças necessárias para colaborar e ajudar o Banco Central e os brasileiros a terem um acesso maior e controle sobre o câmbio, mas naturalmente um valor mais baixo dependerá de uma série de questões, situações e respostas do mercado financeiro e também do Ministério da Economia, de todo um planejamento econômico e da política monetária que o país implementar nos anos vindouros. 

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