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Manaus é um dos casos de cidades brasileiras fora do eixo Sul-Sudeste que cresceu com a chegada da indústria. No ano passado, o Polo Industrial da capital amazonense faturou mais de R$ 160 bilhões, recorde da série histórica. O valor foi 32% maior do que o registrado em 2020. No primeiro semestre deste ano, a receita das indústrias que fazem parte da Zona Franca de Manaus (ZFM) foi 10,74% maior do que o resultado obtido no mesmo período de 2021, segundo a Superintendência da ZFM (Suframa).
Embora compreenda três polos econômicos (indústria, comércio e agropecuária), a ZFM tem as fábricas como base de sustentação. São mais de 500 indústrias na região, que geram mais de 500 mil empregos diretos e indiretos, com destaque para os segmentos de eletroeletrônicos, bens de informática e duas rodas.
O superintendente da Suframa, Algacir Antonio Polsin, destaca a importância do Polo Industrial de Manaus para o estado e para o país. “Atualmente, a região é dependente das indústrias do Polo Industrial de Manaus. Ou seja, esse polo acaba fomentando toda a economia do estado do Amazonas. Naturalmente, a gente acaba fomentando também a empregabilidade em todo o país, pois muitos dos nossos produtos vão para o comércio ou vão como peças integrantes de indústrias de outras partes do país, assim como também compramos peças de outras partes do país para a nossa cadeia de produção aqui em Manaus.”
Há quem atribua parte do sucesso da ZFM ao tratamento fiscal diferenciado que o polo recebe. E é justamente visando o desenvolvimento econômico de outras cidades no Norte e também no Nordeste que a Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei 4.416/2021. O PL prorroga até 2028 incentivos fiscais para empresas nas áreas de atuação das superintendências de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e do Nordeste (Sudene).
Autor do PL, o deputado federal Júlio Cesar (PSD-PI), afirma que, sem a aprovação do texto, os incentivos vão acabar no fim de 2023, prejudicando as empresas e, por consequência, os trabalhadores das regiões. Ele destaca a importância da proposta.
“Tinha os incentivos do Finor [Fundo de Investimento do Nordeste] e do Finam [Fundo de Investimento da Amazônia], mas esses incentivos deixaram de existir em 2007 e ficou apenas a redução para reinvestimento do Imposto de Renda e adicionais daquilo que as empresas pagam. Esta redução poderá ser de até 75% para investimento em novos projetos aqui na região”, destaca.
De acordo com o PL, as empresas beneficiadas conseguem redução de 75% no IR calculado a partir do lucro. O texto também permite que as empresas retenham ainda 30% do IR devido para reinvestirem em projetos de modernização ou compra de equipamentos.
Impactos da descentralização industrial
A concentração das fábricas no eixo econômico mais desenvolvido é um fenômeno que começou ainda no século XX, segundo especialistas ouvidos pelo Brasil 61, mas há formas de difundir a atividade industrial pelo interior do país, gerando emprego, renda e diminuindo a desigualdade regional.
Segundo Marco Antonio Rocha, pesquisador do Núcleo de Economia Industrial e da Tecnologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a história da industrialização brasileira tem origem no complexo cafeeiro no começo dos anos de 1900, centrado no Sudeste e com presença no Sul do país.
“Procurar estabelecer políticas de desconcentração regional é matemática no Brasil desde a década de 50. O plano original da Sudene já era promover a industrialização do Nordeste. A Sudam também tentou criar uma desconcentração regional da indústria via Zona Franca de Manaus”, lembra.
Embora algumas dessas iniciativas tenham obtido sucesso, principalmente na década de 70, diz o especialista, a indústria continuou bastante concentrada no Sudeste do país. “É óbvio que procurar políticas de industrialização para regiões de baixa industrialização é sempre positivo, porque acaba trazendo também esses efeitos que vêm com a vinda da indústria'', pontua.
Mas não basta só querer. A maior presença da indústria nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste requer planejamento. É o que explica a diretora da Agência de Inovação da Universidade Federal do ABC, Cristina Reis.
“A gente precisa pensar nas particularidades socioeconômicas e nas principais demandas da população de cada uma dessas regiões. É preciso identificar quais são as atividades econômicas que têm maior potencial para desenvolver essas regiões, bem como identificar quais são os principais desafios sociais e econômicos a serem superados”, recomenda.
O primeiro passo, segundo Cristina, é mapear as necessidades e demandas locais para só então mobilizar as atividades produtivas para esses objetivos. No Norte, por exemplo, ela cita que há um grande potencial gerado pela bioeconomia. Já no Nordeste, há os desafios de inclusão digital e de desenvolvimento do setor da saúde, que podem fomentar a inovação das indústrias farmacêuticas e de equipamentos hospitalares.
De todo modo, é um trabalho de médio e longo prazo, avalia Cristina. “O investimento na indústria requer um comportamento paciente. Ele não é de curto prazo. A gente precisa ter paciência para plantar de uma maneira bastante inteligente, inclusiva e sustentável as condições para esse futuro melhor, mais dinâmico, que tenha uma atividade industrial forte, que gere inovação, progresso tecnológico, emprego de qualidade, com salários altos, que dinamizem o restante dos setores produtivos”, diz.
Algacir Antonio Polsin, superintendente da Suframa, diz que a ZFM já explora os potenciais de bioeconomia que a Amazônia oferece, mas que isso tende a aumentar “exponencialmente” nos próximos anos.
“Temos buscado mudanças em marcos legais, que potencializam a criação de bioindústrias em toda a Amazônia Ocidental, e estamos transformando o Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA) em uma OS vocacionada para os bionegócios. A bioeconomia tem relação estreita com a vocação natural da Amazônia”, aponta.
“Estruturar essa cadeia, significa vencer obstáculos relacionados ao suprimento, armazenamento adequado em períodos sazonais, aumentar a produtividade, aperfeiçoar as técnicas de beneficiamento e transformação dos ativos naturais, viabilizar o escoamento da produção dos municípios e de suas comunidades. Sobretudo, temos que integrar a produção da bioeconomia à indústria aqui presente, e, para isso, precisamos incentivar e qualificar a pesquisa, para transformá-la em negócios”, completa.
Para o professor Marco Antonio Rocha, a chegada da indústria requer a criação de um sistema formado por instituições que garantam mão de obra qualificada e que invistam em sofisticação tecnológica. “Embora a promoção da desconcentração regional seja muito importante, ela também é muito difícil por conta das instituições que a indústria demanda pra ela ter sucesso e ela ter competitividade. A indústria nunca é uma indústria sozinha, ela é sempre um sistema industrial”, destaca.
Segundo o especialista, o número de municípios que se desenvolveram por meio da indústria caiu nas últimas décadas. Um dos motivos para isso é que as cidades têm poucos recursos para, sozinhas, criar um entorno institucional para a atividade industrial prosperar.
A estratégia para levar a indústria para o interior do Brasil passa, de acordo com Rocha, pela cooperação entre o poder público em suas três esferas: municipal, estadual e federal. “É possível fazer, sobretudo quando você tem apoio do governo estadual, sobretudo do governo federal, porque ele tem uma capacidade de criar políticas de desenvolvimento regional com muito mais recursos, tem capacidade de financiamento da atividade industrial via bancos públicos e também de financiar investimentos para instituições de pesquisa. O primeiro passo para o município é pensar em torno da capacidade dele fazer acordo, recuperações com os outros entes”, avalia.
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