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Mais de 7.000 obras com recursos federais estavam paralisadas ou inacabadas em 2020, de acordo com relatório mais recente do Tribunal de Contas da União (TCU). O número de empreendimentos parados representa 29% de todos os contratos que o TCU analisou, o que representa cerca de uma a cada três obras no país.
Para tentar resolver parte do problema, a Câmara dos Deputados analisa um projeto de lei (1.070/2019) que estabelece que a suspensão de uma obra pública só deve ocorrer após a análise de alguns critérios. Com isso, o autor da proposta, o deputado federal José Medeiros (PODE/MT), espera reduzir a quantidade de obras paralisadas no país, o que ele considera “um dos principais problemas da gestão pública brasileira”.
Relator do PL na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP), o deputado federal Kim Kataguiri (DEM/SP) deu parecer favorável à aprovação do projeto que, segundo ele, consolida os parâmetros que os órgãos de controle e o judiciário devem observar antes de pedir a suspensão de uma obra.
“A ideia é contribuir para que a obra pública seja executada de acordo com os critérios que foram estabelecidos no contrato e que a decisão sobre a continuidade da obra seja tomada com base no interesse público. Ou seja, vai gerar mais custo fazer a manutenção daquela estrutura parada ou contratar outra empresa, fazer uma nova licitação ou mesmo obrigar e fazer alguma sanção contra aquela empresa que já foi contratada para dar seguimento aquela obra?”, argumenta.
Para tentar diminuir o número de obras paralisadas, o texto diz que, se o poder público notar alguma irregularidade na licitação ou execução do contrato, e não for possível resolvê-la, só poderá interromper o empreendimento após avaliar os custos, riscos e benefícios dessa decisão para a sociedade. Veja quais são os critérios:
Segundo Gilberto Gomes, advogado na área de Controles sobre Contratações Públicas, sócio do Piquet, Magaldi e Guedes Advogados, o projeto de lei servirá como um guia de orientação às autoridades que têm o poder de suspender um empreendimento público por conta de alguma irregularidade. “O que a proposta faz é dar a quem vai aplicar essa suspensão de obra um roteiro a seguir. O projeto diz o seguinte: na hora de paralisar uma obra, o controlador ou o juiz tem que fazer a análise de se o custo dessa paralisação vai ser maior ou menor do que o dano que ele está tentando preservar ao erário”, explica.
Obras paradas causam prejuízos à população e aos cofres públicos. De acordo com o TCU, os sete mil empreendimentos parados no Brasil em 2020 representavam R$ 15 bilhões aplicados sem retorno algum à sociedade. “O que a proposta traz é que antes de eu paralisar, eu devo tentar sanar essas irregularidades para seguir a execução da obra, porque essa paralisação causa danos também, ela também tem um custo”, diz.
Ainda segundo o projeto de lei, se a paralisação da obra não se revelar como medida de interesse público, o poder público, ou seja, quem contratou aquela obra, deverá optar pela continuidade do contrato e pela solução da irregularidade por meio de cobrança de indenização por perdas e danos, sem deixar de lado a aplicação de punições e apuração de responsabilidades, segundo a lei.
Kim Kataguiri (DEM/SP) afirma que, nos casos em que as empresas contratadas forem as responsáveis pelas irregularidades, podem perder o direito de dar continuidade à obra, por exemplo. “A gente sabe que vários escândalos de corrupção envolvem contratos aditivos, que é quando a empresa exige mais recursos públicos do que aquilo que foi pactuado inicialmente. Então, primeiro, nesses casos, perder o direito de dar continuidade à obra e ressarcir os cofres públicos pelo dano já causado, pelo tempo em que a obra ficou parada ou em caso da impossibilidade da continuação da obra, com ressarcimento total do valor do contrato”, explicita.
Em 2019, o TCU publicou um relatório de uma auditoria sobre as obras paralisadas no país financiadas com recursos federais. Dos 38 mil contratos que o órgão levantou junto a cinco bancos de dados do Governo Federal, mais de 14 mil estavam paralisados. Juntos, eles somavam R$ 144 bilhões, dos quais R$ 10 bilhões já haviam sido aplicados sem nenhum benefício à população.
Na época, o órgão apontou que entre os efeitos negativos da interrupção dessas obras estavam os serviços não prestados à população, prejuízos ao crescimento econômico do país e empregos não gerados. Apenas em relação aos recursos destinados às creches do Programa Proinfância, cerca de 75 mil vagas deixaram de ser ofertadas à sociedade, por exemplo.
O TCU chegou a publicar um recorte da situação por estado. No Amapá, campeão das obras com recursos federais paralisadas, 51% dos empreendimentos estavam interrompidos. Estados como Mato Grosso do Sul (47%), Paraíba (47%), e Espírito Santo (46%) tinham quase metade das obras paradas.
As principais causas para o abandono foram: contratação com base em projeto básico deficiente, insuficiência de recursos financeiros de contrapartida; e dificuldade de gestão dos recursos recebidos.
Em junho de 2021, o TCU aprovou um novo relatório sobre o cenário e a evolução das obras no país financiadas com dinheiro da União. O documento apontou que 7.862 obras estavam paralisadas ou inacabadas em 2020. No entanto, a comparação com o diagnóstico anterior, de 2019, ficou comprometida, pois dados relativos a 11 mil obras desapareceram dos bancos de dados que o TCU costuma consultar.
Dessa forma, o recorte estadual não foi atualizado, pois, segundo o órgão, “não foi possível obter informações confiáveis dos órgãos e entidades responsáveis”.
Segundo o próprio TCU, o mau planejamento dos empreendimentos é o principal fator de paralisação para as obras públicas, tanto as de baixo como as de alto valor. O advogado Gilberto Gomes diz que é comum empreendimentos serem interrompidos porque o poder público atrasa o pagamento dos fornecedores.
“Iniciou-se a obra com um valor residual de um ano e no orçamento do ano seguinte não foi designado o valor adequado para o prosseguimento desse cronograma. O fluxo orçamentário deficiente ocasiona se não a paralisação, a diminuição do ritmo das obras, e essa diminuição vai ocasionar aditamentos em favor do contratado, porque quanto mais tempo ele fica na obra, mais cara a obra fica pra ele e, em consequência, fica também para o poder público”, alerta.
Após o parecer favorável do relator, o PL está pronto para ser votado na CTASP. O texto também será analisado pelas Comissões de Finanças e Tributação (CFT) e Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Se aprovada, a proposta, vai alterar a Lei 8.666/1993, conhecida como a Lei de Licitações, e a Lei 14.133/2021, a nova Lei de Licitações. Ambas vão coexistir até 2023.
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