Foto: Divulgação
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Sem coleta de esgoto, três em cada quatro sergipanos têm mais chance de pegar covid

Na região metropolitana de Aracaju, epicentro da doença, coleta de esgoto chega a menos da metade dos domicílios; quadro é ainda pior no interior

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Com quase de 19 mil casos confirmados e 462 mortes até 18 de junho, a pandemia de covid-19 tem escancarado um problema estrutural em Sergipe que vai além do colapso na saúde: a falta de saneamento básico. No estado em que 1,6 milhão de habitantes (74,5%) não têm coleta de esgoto e quase 300 mil (13,1%) sequer têm água potável na torneira, a recomendação de lavar as mãos para se proteger da doença se torna um desafio diário. Os dados são do Painel Saneamento Brasil.

Enquanto o vírus avança em cidades do interior, como Nossa Senhora do Socorro e Lagarto, a situação nos grandes centros também preocupa. Na região metropolitana de Aracaju, epicentro da doença e onde vivem quase 950 mil pessoas, 550 mil estão mais expostas à covid-19 por não terem rede coletora de esgoto nem água encanada. Segundo o presidente do Trata Brasil, Édison Carlos, o risco é ainda maior para quem mora nas periferias. 

“Como é que essas pessoas podem se higienizar, em um momento de pandemia, se elas não têm água? Muitas usam água de poço, de cacimba, de cachoeira, de rio. Além de não se higienizar contra o coronavírus, elas podem adquirir outras doenças que são tradicionalmente transmitidas pelo esgoto doméstico”, alerta. 

Em Nossa Senhora do Socorro, que já registra mais de 1,2 mil casos de covid, 71% dos moradores não tem acesso a coleta de esgoto e 17,6% se viram como podem para conseguir água limpa para consumo e para cozinhar alimentos. O índice de tratamento dos resíduos domiciliares na cidade é de apenas 45,6%. O quadro em Lagarto, onde vivem mais de 100 mil pessoas, é ainda pior. Mais de 97 mil pessoas não têm rede coletora de esgotamento sanitário e somente 11% dos efluentes passam por tratamento. A parcela da população sem acesso à água supera os 14%, de acordo com o Painel Saneamento Brasil.

A Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso) atende a 71 dos 75 municípios do estado e é responsável pela ineficiência dos serviços prestados em Aracaju, Nossa Senhora do Socorro e Lagarto. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), quase metade da água (48,7%) é desperdiçada nas redes de distribuição e não chega às torneiras dos sergipanos. Isso faz com que o estado possua o quinto maior índice de perdas do Nordeste. 

Esse volume alto de água reflete as condições de operação do serviço e significa que a situação das redes tem piorado, o que remete à falta de investimentos para manutenção do sistema. O problema é que o estado, principal acionista da Deso, enfrenta grave crise financeira, o que compromete a expansão e a universalização dos serviços de saneamento até 2033, como prevê o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). 

Em janeiro de 2019, o governador Belivaldo Chagas sugeriu que poderia vender de 30% a 40% das ações da Deso, "captando recursos para melhorar os serviços, mas não deixando de ser o acionista majoritário". Também descartou a ideia de privatizar a estatal.
Com a pouca capacidade de investimento da companhia estadual, o presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de

Água e Esgoto (Abcon), Percy Soares Neto, aponta que a única solução é injetar recursos no setor. Segundo ele, a entrada de capital privado no estado seria o caminho e ajudaria, inclusive, a diminuir a pressão no sistema público de saúde, com menos pessoas doentes em virtude da prestação inadequada desses serviços essenciais.

“Para a pessoa que vive em um bairro sem esgoto, não interessa se ela é 1%, 10% ou 20% da população. É um cidadão ou uma comunidade de cidadãos que não está atendida pelos serviços”, ressalta. 

Abertura de concorrência

Em um movimento para atrair mais investimentos e gerar concorrência através da participação da iniciativa privada, o Senado pode votar, na quarta-feira (24), o novo marco legal do saneamento (PL 4.162/2019). 

O texto prevê que os contratos sejam firmados por meio de licitações, facilitando a criação de parcerias público-privadas (PPPs). Ainda de acordo com a proposta, a privatização dos serviços de saneamento não se torna obrigatória, apenas garante a oferta mais vantajosa. Dessa forma, as empresas estatais podem ser mantidas, livres para participarem das concorrências, desde que se mostrem mais eficientes que as empresas privadas que participarem da licitação.

“Isso é importante por conta do déficit que a gente vive. Os recursos públicos para investimento em saneamento são cada vez mais escassos. Com isso, há a necessidade de atrair investimentos privados para o setor”, pontua a pesquisadora do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV/CERI) Juliana Smirdele.

Atualmente, os chamados contratos de programa, maioria em vigência no país, dispensam licitação para escolha da empresa prestadora dos serviços. Isso significa que o atendimento à população não tem qualquer exigência de qualidade ou expansão. 

Segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), 57% das cidades brasileiras que têm contrato para prestação do serviço de esgotamento sanitário operam em situação irregular, o que significa contrato vencido/inexistente ou delegação em vigor sem a prestação do serviço. Na região Nordeste, isso ocorre em 80% dos municípios.

Para melhorar os índices de cobertura no interior de Sergipe, a nova lei possibilita a criação de blocos de municípios. Com isso, duas ou mais cidades passariam a ser atendidas, de forma coletiva, por uma mesma empresa. Entre os critérios que poderão ser utilizados, está a localidade, ou seja, se dois ou mais municípios são de uma mesma bacia hidrográfica, por exemplo.
 

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