LOC.: Em tempos de redes sociais e memes que satirizam a condição humana, uma Proposta de Emenda Constitucional roubou a cena digital nas últimas semanas. A PEC que propõe reduzir a carga horária de trabalho de 44 para 36 horas semanais e, também, põe fim à escala 6x1 de trabalho, com mais horas livres e de descanso, já provoca preocupação em alguns setores da economia, principalmente o comércio.
Este setor, pela mudança proposta pela deputada federal Erika Hilton (PSol-SP) por meio do movimento Vida Além do Trabalho (VAT), está entre os que mais podem sentir impactos negativos com a redução de jornada. Além disso, a mudança também pode provocar o aumento da informalidade nas relações de trabalho que hoje, no Brasil, já chega a quase 40%, ressaltou o economista.
Em entrevista ao Brasil 61, o economista, entusiasta das relações sociais e professor da FAAP–SP, Sillas Souza pontuou os maiores impactos que a proposta pode ter no mercado, na economia e na sociedade brasileira.
Professor, o brasileiro trabalha por que gosta ou trabalha por que precisa?
TEC/SONORA: Sillas Souza - economista e professor da FAAP–SP
“Há um axioma norteador de toda ciência econômica tradicional, chamado de princípio utilitarista da racionalidade. O nome é feio, mas sua ideia é simples. Segundo ela, qualquer pessoa, em qualquer tempo, preferirá obter, sempre que puder, o máximo possível de vantagens pelo mínimo possível de sacrifícios. Se a ciência econômica estiver correta, e entendermos que o trabalho representa, de alguma forma, algum sacrifício, podemos pensar que brasileiros, afegãos, americanos, russos, e até mesmo padres beneditinos, prefeririam não trabalhar, se pudessem.”
LOC.: Muitos países já adotaram o que a PEC propõe, a redução da jornada de trabalho. Como tem sido nesses locais?
TEC/SONORA: Sillas Souza - economista e professor da FAAP–SP
“Na maioria dos países essas medidas surtiram efeitos positivos, como maior tempo de ócio dos trabalhadores, que resultaram em tempo maior com a família, mais descanso, e em muitos casos, aumento da frequência em cursos de aprimoramento profissional. Essas, e outras, coisas combinadas, resultaram em aumentos de produtividades e esse aumento meio que compensou as horas não trabalhadas.
No entanto, o que aconteceu nesses países, até onde eu vejo, não irá acontecer no Brasil ao menos não para a maior parte dos trabalhadores e as razões são diversas. As instituições, formais e informais envolvidas, aqui e lá, são muito distintas. Nosso mercado de trabalho, nossa legislação trabalhista e, principalmente, nossa produtividade média é significativamente diferente desses países.”
LOC.: E aqui no Brasil, como acha que seria o impacto da medida? Alguma eventual reação dos empresários, de tentar compensar seus custos iniciais, poderá levá-los a repassar esses custos aos preços finais?
TEC/SONORA: Sillas Souza - economista e professor da FAAP–SP
“Setores nos quais a maioria dos trabalhadores são celetistas e suas funções não estão diretamente associadas à produção final de bens ou serviços, devem se beneficiar. Colocaria nesse grupo os funcionários de escritórios de profissionais liberais ou outros setores cujo tempo de trabalho não seja a variável mais importante do desempenho.
No entanto, esses profissionais não são, nem de longe, a maioria. Para os informais, como já dissemos antes, nada de significativo irá mudar e com isso excluímos cerca de 40% dos trabalhadores. No setor de serviços, que é o maior e mais importante setor de nossa economia, é onde os impactos negativos deverão ser sentidos. É bastante difícil admitir que uma pessoa que trabalhe no comércio, que, portanto, depende das vendas para obter sua renda, consiga mantê-la no mesmo nível, reduzindo um dia de jornada. Nada sugere que as pessoas irão mudar a forma de fazer compras por conta da menor jornada dos funcionários. Elas continuarão comprando como sempre compraram. Isso obrigará o lojista a, de alguma forma, compensar a ausência de um vendedor com outro.”
LOC.: Isso não poderia causar um efeito rebote, fazendo as pessoas trabalharem mais?
TEC/SONORA: Sillas Souza - economista e professor da FAAP–SP
“Pode acontecer. Muitos desses trabalhadores, me arrisco a pensar que a maioria, tentarão conseguir outros empregos em suas folgas maiores. Dois efeitos, ambos ruins para a economia, decorrerão disso. Primeiro: para os que conseguirem, teremos o efeito oposto da proposta, pois ao invés de 36 horas semanais, serão agora 72. Menos ócio, portanto, equivalerá a uma menor produtividade.
Segundo: A maioria não irá conseguir, mas mais gente ofertando emprego quer dizer mais concorrência pelas vagas o que motivará os empresários a diminuírem os salários médios. Temos uma situação potencial na qual muita gente trabalhará o dobro, para ganhar um pouco mais do que ganhava antes. Isso não me parece vantajoso e esse é o cenário que deverá afetar a maior parte dos trabalhadores. Será, então, que o ganho concentrado nos celetistas mais ricos compensa a perda nos mais pobres? Temo que não.”
LOC.: Conversamos com o professor de economia da FAAP-SP Sillas Souza sobre os possíveis impactos que a PEC 6x1 traria para o Brasil e o mercado de trabalho. Para ver a matéria completa, acesse o site brasil61.com
Reportagem, Livia Braz