Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil
Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil

ENCHENTES: Com menos chuvas no outono, especialistas sugerem a gestores maior investimento em políticas habitacionais

Com o início do outono, as chuvas diminuem. Mas especialistas alertam que é hora de olhar para a política habitacional no Brasil

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O outono começa no dia 20 de março. Deixa para trás um verão que foi trágico para muitas famílias. Segundo levantamento da Defesa Civil dos estados, desde outubro de 2021, foram cerca de 300 mortes em decorrência de chuvas, em cinco estados brasileiros - São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo. Além disso, foram milhares de desabrigados.

A percepção de que os fenômenos naturais estão cada vez mais severos pode estar equivocada, na opinião do meteorologista do Inmet Mamedes Melo. “A natureza é feita por ciclos que podem ser de um ano, 10, 20, 30 ou mesmo 100 anos. De tempos em tempos, registram-se fenômenos mais intensos”, observa o especialista. 

O fenômeno climático chamado Zona de Convergência do Atlântico Sul ocorre anualmente no final da primavera e atua no verão. Ele é o responsável pelo aumento no volume das chuvas no período. "Existem, contudo, alguns outros fenômenos maiores, de grande escala, que podem potencializar os fenômenos recorrentes, como o La Ninha, que é o resfriamento das águas do Pacífico Equatorial que impacta em toda a atmosfera ”, explica Melo. 

Potencializado pelo La Ninha, o volume de chuvas foi potencializado na Bahia e na região Sudeste e também impactou no Centro Oeste. Já em Petrópolis, as fortes chuvas que resultaram na morte de pelo menos 231 pessoas resultaram da junção da topografia, de uma massa de ar quente com a passagem de uma frente fria. Em três horas, foram mais de 200 milímetros de chuva. 

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Fenômenos ambientais, desastres humanos

Doutor em Sociologia Urbana, o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, Benny Schvarsberg, lembra que a maior parte dos casos que resultaram em tragédia já haviam sido notificados pelo Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN). 

“O problema não é a legislação. Não faltam órgãos capazes de implementar essas medidas preventivas. No entanto, há uma grande negligência por parte do poder público em realizar o planejamento e a e a gestão preventiva e sistemática, tanto das ocupações urbanas, quanto do acompanhamento das áreas de risco, sujeitas a aos impactos dos eventos dos extremos climáticos”, pondera Schvarsberg. 

Segundo informativo do Conselho Nacional de Municípios (CNM), publicado no final de fevereiro, atualmente, 1.601 cidades em 26 estados estão classificadas como sendo de risco alto ou muito alto com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos relacionados ao período chuvoso. 

O estado com maior número de municípios que apresenta níveis críticos de áreas com risco geológico é Santa Catarina, com 294 municípios. Depois vem Minas Gerais, com 191 cidades, e São Paulo, com 115. Na Bahia, 88 municípios têm risco para desastres geológicos e o Rio de Janeiro tem cinco. Os dados são de 18 de março do Serviço Geológico do Brasil (CPMR)

Problemas estruturais

Para o professor Schvarsberg os desastres ambientais revelam problemas sociais que envolvem falhas nas políticas habitacionais, falhas na infraestrutura, como sistemas de drenagem e esgotamento. “Em geral, no Brasil, o mercado imobiliário atende pessoas de rendas médias e altas. Não oferece em geral um produtos imobiliários acessíveis a população de baixa renda e isto tem um impacto muito grande porque mais de 70% das necessidades habitacionais são de populações de 0 a 3 salários mínimos.” 

O professor pondera que pessoas de alta renda também moram em morros encostas, mas que essas edificações sofrem menos com os fenômenos climáticos por que são fortificadas e tem sistemas robustos para escoamento. “Em geral, por falta de alternativa de locais adequados, essa população acaba sendo quase condenada a morar em área de risco. Eu não creio que a gente possa entender que seja razoável e as populações gostem de viver perigosamente”, pondera Schvarsberg. 

Para o especialista em infraestrutura e logística, Paulo Cesar Rocha, o poder público precisa efetivar as estratégias de reordenamento urbano precisam ser realistas. “A política de remoção para quilômetros de distância se tornou um fracasso no Brasil.  Procurar fazer Habitações nesses lugares perto de onde as pessoas estão em risco e construir habitações para eles. Porque o preço num terreno é menor sempre menor do que o preço de uma vida perdida”, defende. 

Estratégias de longo prazo

Rocha alerta que a gestão de resíduos sólidos inadequada nas cidades também são um problema que interferem sobre os desastres. “É preciso uma ciência nacional em termos de colocação de lixo. Galerias, rios acabam assoreando com terras, detritos e areia e isso acaba em alagamento”, complementa. 

No Brasil, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) prevê a eliminação dos lixões no País. Até janeiro de 2022, o Governo Federal já havia conseguido eliminar 20% dos lixões do Brasil. A PNRS prevê a divisão de responsabilidades no tratamento adequado de resíduos entre diferentes agentes: poder público (nos âmbito federal, estadual e municipal); iniciativa privada e sociedade. 

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