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Em mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados de extensão do Brasil, a Amazônia Legal corresponde a 60% desse território. Povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e migrantes dividem espaço nos centros urbanos e rurais da região de florestas tropicais e berço de 20% de toda a água doce do planeta Terra. São 27,7 milhões de pessoas vivendo nos nove estados que compõem a região – Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Desse total, mais de nove milhões são de crianças e adolescentes que esperam ter seus direitos reconhecidos.
O Norte ainda lida com preconceitos e estigmas em torno de sua cultura, que muitas vezes é reduzida a “pulmão do mundo”. E isso pode afetar, inclusive, na promoção de ações efetivas para ajudar a população. “Hoje, existem dados de educação, de saúde, de pobreza, uma série de dados multidimensionais de uma forma geral. Mas não existem dados específicos para essa região em relação à violência, por exemplo. Sabemos que são preocupantes, mas não há nada concreto”, lamenta a especialista em Proteção à Criança do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) para a Amazônia Legal, Débora Madeira.
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Segundo um estudo produzido pelo UNICEF, as crianças na Amazônia têm mais risco de morrer antes de completarem um ano de idade. Além disso, a chance de elas não completarem o ensino fundamental também é grande, se comparado a crianças de outras regiões. Alguns fatores podem contribuir para esse índice, como situações de vulnerabilidade, trabalho infantil, exploração sexual e homicídio.
Débora chama a atenção também para a migração para o Brasil de famílias e de jovens dos países vizinhos – a maioria feita pelo Norte. O assédio das facções de crime organizado a essa juventude é um fator que tem causado preocupação. “Sabemos que os jovens que vêm para cá não conseguem oportunidades de escola, trabalho. Eles ficam ‘sem fazer nada’ e em uma situação extremamente vulnerável, até mais que os jovens locais. E é aí que eles são seduzidos e entram para o mundo do crime, pois é um caminho mais fácil”, diz.
Vulnerabilidade
A situação vulnerável dos habitantes da região também é um fator que pode dificultar a ação de políticas públicas para crianças e adolescentes. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE) apontam que, nos nove estados da Amazônia Legal, cerca de 43% das crianças e dos adolescentes vivem em domicílios com renda per capita insuficiente para comprar uma cesta básica – a média nacional é de 34,3%.
O Pará, por exemplo, é o que mais concentra menores de 4 a 17 anos sem educação. O índice de 31,7% é bem superior à média brasileira, que ficou em 20,3% em 2015. Saneamento básico foi um dos itens de maior deficiência na região. Quase 90% da população de até 17 anos de idade no Amapá não tinha acesso ao serviço – no Brasil, a média ficou abaixo de 25%.
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O acesso à informação por jovens de 10 a 17 anos é outro item da lista. Amazonas, Acre e Maranhão tinham entre 49% e 57,1% de adolescentes sem esse direito. A oficial de Participação de Adolescentes do UNICEF para a Amazônia Legal, Joana Fontoura, acredita que fornecer à juventude informações mais qualificadas pode ajudar no exercício da cidadania e na prevenção em relação à saúde sexual, por exemplo.
“O que a gente percebe é que eles têm acesso à informação, à internet, às redes sociais, mas é preciso que eles saibam, de fato, como funciona o organismo deles, como funciona o ciclo menstrual, por exemplo, até para evitar uma gravidez indesejada ou ISTs.”
O trabalho do UNICEF, segundo Joana, é que essas informações cheguem até eles e elas sem preconceito e sem estigma. “Não queremos que eles pensem que buscar esse conhecimento é algo errado ou inalcançável”, reforça.
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Em Urucurituba (AM), município participante dessa edição do Selo UNICEF (2017-2020), a realidade local levou meninas e meninos a buscarem soluções para reduzir o número de adolescentes grávidas. Cleber Marques, mobilizador dos jovens na cidade, conta que, em apenas uma escola, foram encontradas cerca de 30 meninas gestantes – algumas ainda em situação de vulnerabilidade, já que tinham menos de 14 anos.
“Ficamos muito surpresos, até porque boa parte dos jovens que participam das mobilizações estudam nessas escolas. Debater esse assunto é de extrema importância”, afirma Cleber. Uma das estratégias realizadas em Urucurituba foi promover o diálogo por meio dos núcleos de jovens – na Amazônia Legal, eles são conhecidos como Juventude Unida pela Vida na Amazônia (Juva’s). A ideia é reunir, no mínimo, 16 adolescentes (oito meninas e oito meninos) e, a partir daí, espalhar conhecimento para outros colegas.
Hoje, o mobilizador conta que enxerga mudanças significativas no comportamento dos jovens. “Na minha época, a gente não tinha essas informações, até porque nossos pais não falavam diretamente sobre sexualidade. Eu ouvia sobre isso de amigos, de gente de fora.”
Metas
São nesses e em outros casos que o Selo UNICEF atua para devolver a crianças e jovens a esperança de uma vida mais digna. A iniciativa prevê a certificação de prefeituras da Amazônia Legal e do Semiárido que coloquem crianças e adolescentes como prioridade nas ações municipais. Cumprindo as metas propostas, o município recebe, após três anos, um selo que comprova e reconhece o esforço da comunidade envolvida.
Entre as estratégias previstas, estão viabilizar a volta às aulas; a valorização da primeira infância; a promoção de direitos sexuais e reprodutivos; a proteção contra a violência, em especial a redução dos homicídios, e a participação e mobilização de adolescentes.
Amazônia Legal
A Amazônia Legal foi instituída pelo governo ainda na década de 1950 (Lei 1.806/1953). A ideia foi reunir estados da região que tivessem desafios econômicos, políticos e sociais semelhantes para um melhor planejamento e promoção de políticas públicas específicas. O critério para determinar as unidades da federação pertencentes à Amazônia Legal foram mais pautados por análises sociopolíticas do que territoriais, já que Maranhão e Mato Grosso se juntam aos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.
A Amazônia Legal é uma área de mais de 5 milhões km², o que corresponde a 61% do território brasileiro. A região abriga todo o bioma da Amazônia e parte do Cerrado e do Pantanal mato-grossense. Além disso, na Amazônia Legal está a Bacia Amazônica, a maior bacia hidrográfica do mundo.
A exploração de madeira, o desmatamento e os conflitos fundiários estão entre os problemas enfrentados nos estados da Amazônia. Entre julho e agosto de 2019, os impactos ambientais gerados só pelos desmatamentos cresceram mais de 40%. Entre janeiro e agosto do mesmo ano, o número de queimadas também aumentou (83%), se comparado ao mesmo período do ano passado. As consequências podem gerar, entre outros, aquecimento global, prejuízos socioambientais, aumento no número de mortes e impactos econômicos negativos.
O Selo
Implantado pela primeira vez em 1999, no Ceará, o Selo UNICEF já contabiliza 20 anos de história e de mudança na vida de milhões de crianças e de adolescentes em situação de vulnerabilidade no Semiárido e na Amazônia Legal. Atualmente, 18 estados são alcançados pela ação – Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e norte de Minas Gerais, no Semiárido, e Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, na Amazônia Legal.
Saiba mais: Selo UNICEF encerra ciclo de ações e convoca municípios do Semiárido e Amazônia Legal a apresentarem resultados
Com o sucesso das experiências, o Selo cresceu e, hoje, procura aplicar o aprendizado das edições anteriores aos participantes da atual. A metodologia foi unificada para o Semiárido e Amazônia Legal e introduziu o conceito de Resultados Sistêmicos no lugar de ações, visando dar sustentabilidade às iniciativas dos municípios e garantir que as crianças e adolescentes continuem sendo beneficiadas pelas políticas públicas implementadas mesmo após o fim do ciclo.
O Selo é dividido em ciclos, que coincidem com as eleições municipais. No atual ciclo (2017-2020), mais de 2,3 mil prefeituras, em 18 estados, estavam aptas a participar da edição. Dessas, 83% aderiram à ação – ou seja, 1.924, sendo 1.509 do Semiárido e 805 da Amazônia Legal. Cumprindo as metas propostas pela ação, o município recebe, após três anos, um selo que comprova e reconhece o esforço da comunidade envolvida.
No ciclo de 2017-2020, os municípios devem apresentar os resultados das ações desenvolvidas até 31 de março, por meio da plataforma Crescendo Juntos, no site do Selo UNICEF. A comprovação das atividades é feita por meio de documentos comprobatórios e anexados no portal. O envio pode ser feito pelo computador, celular ou tablet ou com auxílio de agentes comunitários, caso o município não tenha acesso à internet.
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