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Revogação do decreto de armas provoca riscos à segurança no comércio e favorecimento a criminosos, apontam especialistas

Especialistas em segurança pública veem medida como equivocada e temem também pelo aumento do contrabando de armamentos

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Uma das primeiras medidas tomadas pelo recém-empossado presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi a revogação de uma série de normas do decreto de armas. A medida foi publicada no Diário Oficial dessa segunda-feira (2) e já está em vigor. A principal mudança está no acesso ao porte e à posse desses itens, com a proibição da venda de armas e munições de uso restrito e limitações na quantidade de armamentos permitidos por pessoa.

As regulamentações sobre flexibilização do porte e posse de armas e munições foram sancionadas em 2019, pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). A medida era uma das promessas de campanha do ex-chefe do Executivo federal. 

O ministro da Defesa, Flávio Dino (PSB), que também assina o decreto de revogação das normas, disse por meio das redes sociais que haverá um novo recenseamento geral das armas no Brasil. Segundo o ministro, a medida visa “separar o joio do trigo” e um grupo de trabalho será montado para elaborar uma nova regulamentação.

Veja os principais pontos alterados

  • Fica proibida a venda de armas e munições de uso restrito. Antes, Colecionador, Atirador e Caçador (CAC) tinham direito a ter até 60 armas, sendo até 30 de uso restrito;
  • Cada pessoa poderá ter, no máximo, três armas de fogo de uso permitido;
  • Para os CACs, o novo decreto limita a compra de 600 munições por arma. Antes era permitido a compra de 5 mil munições por arma;
  • A idade mínima para ter registro de arma é de 25 anos. No antigo decreto, menores de idade poderiam ter acesso a armas de fogo e praticar tiro, desde que com autorização dos pais ou responsáveis;
  • Proibição do porte de trânsito, o que significa, por exemplo, que CACs não podem mais andar com armas municiadas para ir a competições e clubes de tiros;
  • Suspensão de novos registros de CACs e clubes de tiro até nova regulamentação.

Consequências da revogação

O instrutor de tiro Lucas Aurélio acredita que a medida vai prejudicar o setor como um todo, inclusive na manutenção e geração de empregos. Sobre o porte de trânsito, Aurélio, que é CAC há três anos, considera que os profissionais ficarão mais vulneráveis a criminosos durante o percurso para competições e clubes de tiro.

“A gente vai continuar deixando só o bandido armado. O cidadão passa por várias etapas para conseguir uma arma de fogo, demora um período de oito a dez meses, e a gente está vendo tudo ir por água abaixo. Infelizmente é o que está acontecendo.”, considera o instrutor de tiro.

Essa preocupação também é compartilhada por especialistas da área de segurança pública. De acordo com o cientista político e especialista em segurança pública Antônio Flávio Testa, a revogação das normas do decreto das armas foi tomada de forma ideológica. O especialista afirma que a legislação e fiscalização no país é rígida para quem possui armamentos e que essa revogação vai prejudicar lojistas e profissionais da área, além de favorecer o contrabando.

“Fica um discurso ideológico. Você tem no Brasil uma lei que garante o direito de armas legais. Não é fácil você comprar uma arma no Brasil, registrar, é muito caro e tem uma burocracia excessiva. Um decreto não pode se sobrepor a uma lei. Fica um discurso ideológico populista.”, analisa Testa.

O especialista em segurança pública e privada Leonardo Sant’Anna também analisa que a revogação é equivocada. Para ele, mesmo com o aumento do número de registro de armas - hoje há mais de 2 milhões de armas registradas no país - o número de crimes cometidos com esses armamentos não acompanhou esse aumento.

“Locais como o Distrito Federal, por exemplo, que chegou a ter um aumento de 600% na emissão de registro e compras de arma de fogo demonstraram uma redução drástica nos índices de criminalidade, principalmente os CVLI, que são os crimes violentos letais e intencionais.”, analisa Leonardo Sant’Anna.

Queda nas mortes violentas intencionais 

Em 2017, o Brasil bateu o recorde na taxa de mortes violentas intencionais (MVI), ou crimes violentos letais intencionais (CVLI), segundo o Anuário de Segurança Pública Brasileiro, com uma média de 30,9 mortes a cada 100 mil habitantes. No entanto, desde 2018, a média desse tipo de morte vem caindo no país. Em 2021, segundo dados do Anuário, a taxa caiu para 22,3 mortes a cada 100 mil habitantes.

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