Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Campos Neto diz que é preciso ter "boa vontade com governo", mas defende autonomia do Banco Central

Em palestra a investidores, presidente do Banco Central colocou panos quentes na relação com o Executivo, mas afirmou que autonomia do Bacen deve ser garantida. Nos últimos dias, governo criticou o elevado patamar dos juros

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O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que é preciso ter "mais boa vontade" com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas defendeu a autonomia do Bacen na definição da política monetária, em evento promovido pelo BTG Pactual, nesta terça-feira (14). 

"A autonomia é muito importante. Nesse cenário de inflação alta, a autonomia é sempre desafiada em vários lugares, inclusive em países desenvolvidos. Na Inglaterra, teve uma crítica enorme. Se você olhar, hoje a Inglaterra é o pior desempenho da Europa disparado. Está totalmente fora do resto", afirmou.  

Segundo Campos Neto, em países sul-americanos, como Colômbia e Peru, a autonomia dos bancos centrais foi mais questionada justamente na primeira troca de governo pós-independência dessas instituições. "A primeira mudança de governo gera mais ruído mesmo, mas quando isso sobrevive, navega muito bem. Não é sobre o Banco Central, sobre Roberto Campos. É sobre ganho institucional, que gera uma melhoria na vida das pessoas".   

O Banco Central passou a receber críticas de Lula e de outras figuras ligadas ao governo depois que decidiu manter a taxa básica de juros da economia, a Selic, em 13,75%. O presidente chegou a classificar como "vergonha" o patamar de juros atual e indicou que pode rever a autonomia do Bacen, após o fim do mandato de Campos Neto. 

Paciência

Roberto Sallouti, CEO do BTG Pactual, afirmou que, no fim do ano passado, o cenário econômico se mostrava muito favorável ao Brasil, devido ao fim do ciclo de alta nos juros em todo o mundo; à reabertura da economia chinesa – principal parceiro comercial do país –  e à intenção de investimentos no Brasil ligados à pauta ambiental. 

"Logo após as eleições, o mercado reagiu fortemente. O real começou a apreciar. No início deste ano, a curva deixou de precificar quedas. O real que, se tivesse acompanhado o que aconteceu com outras moedas emergentes, deveria estar em R$ 4,80. A gente não está aproveitando essa oportunidade que o mundo está nos dando. Isso ajudaria até o Brasil a seguir um caminho de queda de juros e arrefecer esse aperto monetário". 

Ao ser questionado sobre o que o Brasil precisa fazer para que a taxa de juros comece a cair, Campos Neto disse que a inflação de curto prazo não piorou, mas que houve uma mudança de expectativa por causa do prêmio de risco. Ou seja, os investidores exigem taxas de juros mais altas para emprestar dinheiro ao governo diante da incerteza quanto ao ajuste das contas públicas, que ainda está em discussão. 

Diante disso, ele pregou mais paciência com o governo eleito. "O investidor é muito apressado, afoito. Acho que a gente tem que ter um pouco mais de boa vontade com o governo. Quarenta e cinco dias é pouco tempo. Acho que tem havido uma boa vontade enorme do ministro Haddad de falar: olha, temos  um princípio de seguir um plano fiscal com disciplina'. Tem o arcabouço fiscal que está sendo trabalhado."  

Inflação

Na próxima quinta-feira (16), o Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne para debater a meta de inflação para 2023 que, hoje, está em 3,25%. Campos Neto, como representante do Banco Central, tem direito a um voto; já o governo tem direito a dois, nas figuras de Fernando Haddad, ministro da Fazenda, e Simone Tebet, ministra do Planejamento. 

Campos Neto lembrou que quem preside o CMN é o ministro da Fazenda e que quem determina a meta não é o Bacen, que tem só um dos três votos. "Acho que é importante respeitar as instituições e jogar com as regras do jogo. A regra do jogo é clara: quem determina meta não é o Bacen. O Banco Central segue a meta, tem um conjunto de instrumentos disponíveis e tem autonomia dentro desses instrumentos para seguir a meta", disse. 

O presidente do Banco Central também afirmou que foi consultado por parlamentares se seria a favor de um projeto de lei que só permitiria a mudança na meta da inflação pelo CMN se a decisão fosse unânime – diferentemente do que é hoje, em que a escolha se dá por maioria dos votos. "Eu disse que não. Sou contra. Isso não é a regra do jogo. Quem determina a meta é o governo. O Bacen segue a meta". 

Segundo Campos Neto, a ideia de aumentar a meta de inflação – defendida por integrantes do governo Lula – pode não gerar o efeito esperado.  "O sistema de metas mostrou que funciona. Tem um grupo que acha que, como a inflação mundial subiu muito, deveria se reavaliar a meta. Mas tem outro grupo que diz que não dá para fazer assim, porque se você não bate a meta e aumenta a meta, os agentes vão precificar a inflação futura na nova meta, mas vão colocar um prêmio maior do que o prêmio que existia em relação à meta antiga. Não só ganha folga, como perde. Eu me situo neste segundo grupo". 

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou em 2022 em 5,79%, acima dos 3,5% da meta de inflação prevista para o ano passado. 

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