Foto: DCStudio/Freepik
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Indústria química critica veto ao Reiq e diz que concorrentes têm regimes semelhantes

O presidente da Abiquim discorda do veto ao dispositivo que previa extinção gradual do Regime Especial da Indústria Química até 2027. Ciro Marino diz que governo não levou em consideração políticas de outros países que competem com o Brasil

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O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a Medida Provisória 1.095/2021, que altera o Regime Especial da Indústria Química (Reiq), nessa quarta-feira (22). Criado em 2013, o Reiq concede incentivos tributários à indústria química para que o segmento consiga ser competitivo no mercado internacional. A MP aprovada pelo Congresso previa um período de transição para o fim do regime até 2027, mas o Executivo não concordou com esse prazo. 

Nesta quinta-feira (23), Ciro Marino, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), disse que vai seguir dialogando com o governo federal e o Legislativo para mostrar a importância do Reiq para o setor e a indústria brasileira. “Os países com os quais competimos têm os seus próprios ‘Reiqs’ e isso talvez não tenha sido colocado em perspectiva na análise do governo federal”, avaliou durante o evento “Diálogos com a Química”.  

Ciro também afirmou que as idas e vindas em torno da extinção do Reiq causam insegurança jurídica e dificultam a atração de investimentos. “A lei já previa uma redução gradual [do Reiq] e a sua extinção. Mexer nesse momento cria instabilidade e não é bom. A gente deve seguir dialogando com o governo para explicar o que acontece lá fora. Se nós hoje seguimos um governo liberal baseado nas premissas da Escola de Chicago, os EUA são os primeiros a fazer isso [adotar medidas protecionistas]”, destacou. 

O deputado federal Afonso Motta (PDT-RS), presidente da Frente Parlamentar Mista pela Competitividade da Cadeia Produtiva do Setor Químico, Petroquímico e de Plástico, ressaltou que o Congresso Nacional trabalhou para manter o Reiq e preservar a competitividade do setor químico, mas que o veto parcial à MP impossibilita isso.  

“Depois de termos avançado em mais um entendimento, que não satisfez a indústria química brasileira, mas que trabalhamos muito para que ele acontecesse, tivemos vetos do presidente da República, que nos distanciou do mínimo dos mínimos, que é a compreensão dessa competitividade, o reconhecimento da importância da atividade para o nosso país”, entende. 

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Desproporção

Segundo a Abiquim, o setor gera dois milhões de empregos diretos e indiretos no país. O faturamento chega a 118 bilhões de dólares por ano, o que faz da indústria química brasileira a sexta maior do mundo. De todo o PIB industrial do país, a indústria química responde por 11%, sendo a terceira maior em faturamento. Apesar disso, é o setor industrial que mais paga impostos, o que é desproporcional, ressaltou Ciro. 

“Nós somos o terceiro setor em PIB, porém somos o primeiro setor em arrecadação federal. Isso mostra que há um descompasso nas questões tributárias no Brasil. Esperamos que num horizonte visível de poucos anos a gente tenha uma reforma tributária que possa acomodar essa situação, porque a indústria, de forma geral, inclusive a química, opera com cerca de 40% a 45% de carga tributária, enquanto os nossos concorrentes da OCDE operam com 20% a 25%. Temos que trabalhar nisso”, pontua. 

Um dos argumentos da indústria química pela manutenção do Reiq é que o regime ajuda a minimizar os danos que o Custo Brasil impõe às empresas do país que, diante da alta carga tributária e da falta de infraestrutura, por exemplo, têm pouca competitividade no mercado externo. 

Segundo Ciro, as indústrias químicas brasileiras pagam 300% a mais por gás natural, insumo essencial para a produção, do que as americanas, e mais de 400% do que outros países pagam pela eletricidade. Além disso, ele diz que os países com os quais o Brasil compete também têm seus próprios regimes especiais de incentivo à indústria química. 

Oportunidade

Em parceria com a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, a Abiquim promoveu o evento “Diálogos com a Química”. A atividade reuniu representantes do poder público e privado para debater a importância do setor na retomada da economia. 

Os painelistas reforçaram que a indústria química brasileira não pode ficar à mercê de estratégias de governo temporárias, mas que precisa de ações de longo prazo, conforme destacou Flávio Rocha, secretário especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.  

Daniela Marques, representante do Ministério da Economia, disse que a indústria química brasileira pode ser protagonista em um cenário econômico que pede por soluções verdes e digitais. “Cabe a nós apoiar e não atrapalhar o setor produtivo. É para isto que estamos aqui: construir política de Estado e promover uma retomada de crescimento sustentado do Brasil através de investimentos privados”, disse. 

A secretária de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação, Glenda Lustosa, citou que a alta nos custos da energia e das matérias-primas, a carga tributária e a baixa infraestrutura devem ser alvos das autoridades. Por outro lado, chamou a atenção dos participantes para as vantagens da indústria química nacional. 

“O Brasil segue sendo território fértil para a indústria química a partir da abundância de matérias-primas e energia, de seu parque industrial, grande consumidor de produtos do setor químico e que está sendo objeto de reindustrialização pelo governo federal”. 

Já o economista Paulo Gala, da Fundação Getulio Vargas (FGV), destacou que os países mais ricos, com alta renda per capita e baixa desigualdade, são aqueles que fabricam produtos sofisticados, entre os quais se incluem os itens da indústria química. Segundo Gala, a indústria química brasileira domina boa parte do processo de fabricação desses produtos, mas não consegue acessar o mercado internacional de forma competitiva. 

“O Brasil tem um potencial fantástico em termos de conquistar os mercados no mundo e de avançar a sua química em relação às capacidades que a gente já domina. Não adianta a gente achar que, com abertura comercial, e com livre comércio a gente vai conseguir bater os gigantes do mundo que operam em mercados absurdamente concentrados. A gente vai precisar de políticas públicas e de parcerias público-privadas, de uma série de medidas que nos ajude a enfrentar essa concentração industrial”, concluiu. 

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